Capítulo 1

1. Livro da geração de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão.
2. Abraão gerou a Isaque, e Isaque gerou a Jacó; e Jacó gerou a Judá e a seus irmãos.
3. E Judá gerou de Tamar a Perez, e a Zerá; e Perez gerou a Esrom; e Esrom gerou a Arão.
4. E Arão gerou a Aminadabe; e Aminadabe gerou a Naassom; e Naassom gerou a Salmom.
5. E Salmom gerou de Raabe a Boaz; e Boaz gerou de Rute a Obede; e Obede gerou a Jessé.
6. E Jessé gerou ao rei Davi; e o rei Davi gerou da que foi mulher de Urias a Salomão.
7. E Salomão gerou a Roboão; e Roboão gerou a Abias; e Abias gerou a Asá.
8. E Asá gerou a Josafá; e Josafá gerou a Jorão; e Jorão gerou a Uzias.
9. E Uzias gerou a Jotão; e Jotão gerou a Acaz; e Acaz gerou a Ezequias.
10. E Ezequias gerou a Manassés; e Manassés gerou a Amom; e Amom gerou a Josias.
11. E Josias gerou a Jeconias e a seus irmãos, na deportação da Babilônia.
12. E depois da deportação da Babilônia, Jeconias gerou a Salatiel; e Salatiel gerou a Zorobabel.
13. E Zorobabel gerou a Abiúde; e Abiúde gerou a Eliaquim; e Eliaquim gerou a Azor.
14. E Azor gerou a Sadoque; e Sadoque gerou a Aquim; e Aquim gerou a Eliúde.
15. E Eliúde gerou a Eleazar; e Eleazar gerou a Matã; e Matã gerou a Jacó.
16. E Jacó gerou a José, o marido de Maria, da qual nasceu Jesus, chamado “o Cristo”.
17. De maneira que todas as gerações, desde Abraão até Davi, são catorze gerações; e desde Davi até a deportação da Babilônia, são catorze gerações; e desde a deportação da Babilônia até Cristo, são catorze gerações.
18. E o nascimento de Jesus Cristo foi assim: estando Maria, sua mãe, desposada com José, antes que se ajuntassem, se achou que estava grávida do Espírito Santo.
19. Então José, seu marido – como era justo, e não a quisesse difamar –, quis deixá-la secretamente.
20. E intentando ele isto, eis que o anjo do Senhor lhe apareceu em sonho, dizendo: José, filho de Davi, não temas receber a Maria, tua mulher; porque o que nela está concebido, do Espírito Santo éO posicionamento do verbo “é” no final da oração nada tem a ver com uma suposta influência da tradução holandesa da Bíblia, e nem mesmo do texto grego de referência – sendo que este termina com o adjetivo ἅγιος/hagios, isto é, “santo”. Trata-se na verdade, por um lado, de influência da própria tradução castelhana de Casiodoro de Reina, que traz “del Espíritu Santo es”, e por outro, do latim clássico da Vulgata, que emprega “de Spiritu Sancto es”. Em síntese, é apenas uma questão estilística, ligada à sonoridade do texto, sem qualquer relação com uma eventual tentativa de reproduzir a ordem original das palavras no texto grego..
21. E ela dará à luz um filho, e por-lhe-ás por nome Jesus; porque ele salvará a seu povo de seus pecados.
22. Tudo isso aconteceu para que se cumprisse o que da parte do Senhor foi dito pelo profeta, o qual disse:
23. Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um filho; e por-lhe-ás por nome Emanuel, que traduzido quer dizer “Deus conosco”.
24. E despertando José do sono, fez como o anjo do Senhor lhe mandara, e recebeu a sua mulher.
25. E não a conheceu, até que ela deu à luz a este seu filho, o primogênito; e pôs-lhe por nome “Jesus”.

Capítulo 2

1. E havendo Jesus já nascido em Belém da Judeia, nos dias do rei Herodes, eis que vieram uns magos do oriente a Jerusalém,
2. Dizendo: Onde está o recém-nascido rei dos judeus? Porque vimos sua estrela no oriente, e viemos para adorá-lo.
3. E ouvindo o rei Herodes isto, perturbou-se, e com ele toda Jerusalém.
4. E convocados todos os príncipes dos sacerdotes, e os escribas do povo, perguntou-lhes onde o Cristo havia de nascer.
5. E eles lhe disseram: Em Belém da Judeia, porque assim está escrito pelo profeta:
6. E tu, ó Belém, terra de Judá, de nenhuma maneira és a menor entre os príncipes de Judá; porque de ti sairá o guia, que a meu povo, Israel, há de apascentar.
7. Herodes então, chamando secretamente aos magos, soube diligentemente junto deles o tempo do aparecimento da estrela.
8. E enviando-os a Belém, disse: Ide, e perguntai com diligência pelo menino; e achando-o, fazei-mo logo saber, para que também eu vá, e o adore.
9. E havendo eles ouvido o rei, foram-se. E eis que a estrela que tinham visto no oriente ia diante deles; até que, chegando, pôs-se sobre onde estava o menino.
10. E vendo eles a estrela, alegraram-se muito, com grande alegria.
11. E entrando na casa, acharam ao menino com sua mãe, Maria; e prostrando-se, o adoraram. E abrindo seus tesouros, lhe ofereceram dádivas: ouro, e incenso, e mirra.
12. E sendo por divina revelação avisados em sonho, que não voltassem a Herodes, tornaram-se à sua terra por outro caminho.
13. E partidos eles, eis que o anjo do Senhor apareceu a José, em sonho, dizendo: Levanta-te, e toma ao menino e à sua mãe, e foge ao Egito; e fica-te lá até que eu to diga. Porque Herodes há de buscar ao menino para o matar.
14. E despertando ele, tomou ao menino e à sua mãe, de noite, e foi-se para o Egito.
15. E esteve lá até a morte de Herodes, para que se cumprisse aquilo que da parte do Senhor foi dito pelo profeta, que disse: Do Egito chamei a meu filho.
16. Vendo-se então Herodes escarnecido Mais do que apenas “enganado” ou “iludido”, o verbo grego original ἐμπαίζω/empaizó carrega mesmo um sentido mais pejorativo de escárnio, zombaria, motejo, etc. Tal sentido aparece claramente nas principais fontes bíblicas consultadas pelo tradutor português, como no castelhano “burlado”, no francês “moqués”, ou no italiano “beffato”. Contudo, possivelmente seguindo a nota explicativa que aparece na Bíblia holandesa, o tradutor português toma o cuidado de não afirmar que Herodes viu que teria sido de fato escarnecido pelos magos, mas sim que viu-se ridicularizado, isto é, segundo a sua própria opinião; evitando-se assim a interpretação de que os tais magos (ou sábios) teriam zombado de uma autoridade secular.pelos magos, indignou-se de tal maneira que mandou matar a quantos meninos havia em Belém, e em todos seus termos, da idade de dois anos e abaixo; conforme ao tempo que dos sábios bem se tinha informado.
17. Então se cumpriu o que foi dito pelo profeta Jeremias, o qual disse:
18. Uma voz se ouviu em Ramá: lamentação, choro, e grande gemido. Chorava Raquel por seus filhos, e não quis ser consolada, porque já não são.
19. Porém morto Herodes, eis que o anjo do Senhor apareceu no Egito a José, em sonho,
20. Dizendo: Levanta-te, e toma ao menino e à sua mãe, e vai-te para terra de Israel; pois mortos são já os que procuravam a morte do menino.
21. Então levantou-se ele, e tomou ao menino e à sua mãe, e foi-se para terra de Israel.
22. E ouvindo que Arquelau reinava na Judeia, no lugar de Herodes, seu pai, receou ir para lá; mas admoestado por divina revelação em sonhos, foi-se para as partes da Galileia.
23. E veio, e habitou numa cidade chamada Nazaré; para que se cumprisse o que pelos profetas foi dito, isto é, que nazareno havia de se chamar.

Capítulo 3

1. E naqueles dias veio João Batista, pregando no deserto da Judeia,
2. E dizendo: Convertei-vos, porque próximo está o reino dos céus.
3. Porque este é aquele do qual foi dito pelo profeta Isaías, que disse: Voz do que clama no deserto; preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas.
4. E o mesmo João tinha sua veste de pelos de camelo, e um cinto de couro ao redor de seus lombos; e sua comida era gafanhotos e mel montesinho.
5. Então saía a ele Jerusalém, e toda a Judeia, e toda a província ao redor do Jordão.
6. E foram por ele batizados no Jordão, confessando seus pecados.
7. E vendo ele a muitos dos fariseus e dos saduceus, que vinham ao seu batismo, dizia-lhes: Raça de víboras! Quem vos ensinou a fugir da ira que está por vir?
8. Dai, pois, frutos dignos de conversão!
9. E não presumais, dizendo em vós mesmos: A Abraão temos por pai. Porque eu vos digo que até destas pedras pode Deus despertar filhos a Abraão.
10. E já agora está também o machado posto à raiz das árvores; assim que, toda árvore que não dá bom fruto, corta-se, e lança-se no fogo.
11. Quanto a mim, verdade é que eu vos batizo com água, para conversão. Mas aquele que após mim vem, mais poderoso é que eu, cujos sapatos não sou eu digno de levar; este vos batizará com Espírito Santo, e com fogo.
12. Cuja pá ele tem já em sua mão; e limpará sua eira, e no celeiro recolherá seu trigo, e a palha queimará com fogo que nunca se apague.
13. Então veio Jesus desde a Galileia até João, junto ao Jordão, para ser batizado por ele.
14. Mas João lhe resistia muito, dizendo: Eu que necessito de ser batizado por ti, e vens tu a mim?
15. Porém respondendo Jesus, disse-lhe: Deixa por agora, porque assim nos convém cumprir toda justiça. Então ele o deixou.
16. E sendo Jesus batizado, subiu logo da água; e eis que os céus se lhe abriram, e viu ao Espírito de Deus que descia como pomba, e vinha sobre ele.
17. E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é meu filho, meu amado, em quem me agrado.

Capítulo 4

1. Então foi Jesus levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo.
2. E havendo jejuado quarenta dias e quarenta noites, por fim teve fome.
3. E chegando-se a ele o tentador, disse: Se tu és filho de Deus, dize que estas pedras se façam pães.
4. Porém respondendo ele, disse: Escrito está: Não só com o pão viverá o homem, mas com toda palavra que da boca de Deus sai.
5. Então o levou o diabo consigo à santa cidade, e o pôs sobre o pináculo do templo.
6. E disse-lhe: Se tu és filho de Deus, lança-te abaixo; porque escrito está que ele te encomendará a seus anjos, e que nas mãos te levantarão, para que nunca com teu pé tropeces em pedra alguma.
7. Disse-lhe Jesus: Também está escrito: Não tentarás ao Senhor, teu Deus.
8. Outra vez o levou o diabo consigo a um monte mui alto, e mostrou-lhe todos os reinos do mundo, e a glória deles.
9. E disse-lhe: Tudo isto te darei, se prostrado me adorares.
10. Então lhe disse Jesus: Arreda-te, Satanás; pois escrito está: Ao Senhor, teu Deus, adorarás, e a ele só, servirás.
11. Então o deixou o diabo; e eis que vieram os anjos, e o serviam.
12. Mas ouvindo Jesus que João estava entregueNo lugar de “entregue”, a tradução castelhana de Casiodoro de Reina traz “preso”, mas indica em nota que o termo grego original παρεδόθη/paredothē significa literalmente “entregue”. Seguindo assim uma forma de expressão mais literal, a tradução portuguesa se aproxima nesse caso da Bíblia holandesa, que também opta por manter no texto o sentido de “entregue”, mas esclarece em nota que a interpretação do termo, pelo contexto, deve ser “entregue à prisão”., tornou-se para a Galileia.
13. E deixando a Nazaré, veio e habitou em Cafarnaum, cidade marítima, nos confins de Zebulom e Naftali;
14. Para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta Isaías, que disse:
15. A terra de Zebulom, e a terra de Naftali, junto ao caminho do mar, do outro lado do Jordão, a Galileia das gentes.
16. O povo assentado em trevas viu uma grande luz; e aos assentados em região e sombra de morte, a luz lhes apareceu.
17. Desde então, começou Jesus a pregar, e a dizer: Convertei-vos, porque já está próximo o reino dos céus.
18. E andando Jesus junto ao mar da Galileia, viu a dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão, que estavam lançando a rede ao mar (porque eram pescadores).
19. E disse-lhes: Vinde após mim, e far-vos-ei pescadores de homens.
20. Então eles, deixando logo as redes, o seguiram.
21. E passando dali, viu a outros dois irmãos: Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, num barco com Zebedeu, seu pai, os quais estavam remendando suas redes; e chamou-os.
22. E eles logo deixando o barco, e a seu pai, o seguiram.
23. E rodeou Jesus toda a Galileia, ensinando em suas sinagogas e pregando o evangelho do reino; e sarando toda enfermidade, e toda fraqueza no povo.
24. E corria sua fama daí por toda a Síria; e traziam-lhe todos os que se achavam mal, tomados de diversas enfermidades e tormentos, e aos endemoninhados, e aluados, e paralíticos; e sarava-os.
25. E seguiam-no numerosas multidões da Galileia, e de Decápolis, e de Jerusalém, e da Judeia, e dalém do Jordão.

Capítulo 5

1. E vendo Jesus as multidões, subiu ao monte; e assentando-se, chegaram-se a ele seus discípulos.
2. E abrindo sua boca, ensinava-os, dizendo:
3. Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus.
4. Bem-aventurados os tristes, porque eles serão consolados.
5. Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra.
6. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos.
7. Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia.
8. Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus.
9. Bem-aventurados os pacíficos, porque eles serão chamados filhos de Deus.
10. Bem-aventurados os que padecem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus.
11. Bem-aventurados sois vós outros quando os homens vos injuriarem, e perseguirem; e de vós disserem todo mal, por minha causa, mentindo.
12. Regozijai-vos e alegrai-vos, que grande é vosso galardão nos céus. Porque assim perseguiram aos profetas que foram antes de vós outros.
13. Vós sois o sal da terra; pois se o sal se esvaecer, com que se salgará? Para nada mais presta, senão para se lançar fora, e pelos homens ser pisado.
14. Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder a cidade sobre o monte fundada.
15. Nem se acende a candeia, e se põe debaixo do alqueire; mas sim no candeeiro, e alumia a todos quantos na casa estão.
16. Assim resplandeça vossa luz diante dos homens; para que vejam vossas boas obras, e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus.
17. Não julgueis que vim para desatar a Lei, ou os profetas; não vim para desatá-los, senão para cumpri-los.
18. Porque em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, nem um jota nem um til se passará da Lei, sem que tudo aconteça.
19. De maneira que, qualquer que desatar um destes mais pequenos mandamentos, e assim ensinar aos homens, será chamado “o mais pequeno” no reino dos céus; porém qualquer que os fizer e ensinar, esse será chamado “o grande” no reino dos céus.
20. Portanto vos digo que, se vossa justiça não sobrepujar a dos escribas e fariseus, de nenhuma maneira entrareis no reino dos céus.
21. Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; mas qualquer que matar, será réu de juízo.
22. Porém eu vos digo que, qualquer que contra seu irmão sem razão se indignarEm vez de “sem razão”, a tradução castelhana de base sugere “loucamente”, esclarecendo também em nota que “indignar-se loucamente” seria próprio de uma ira carnal. A versão portuguesa, por sua vez, seguindo mais de perto a interpretação de outras Bíblias certamente consultadas pelo tradutor – como a holandesa, a francesa e a italiana –, enfatiza que tal indignação seria pecaminosa somente na medida em que fosse “sem razão”, isto é, injusta ou indevida. O caráter problemático dessa passagem é atestado pelo fato de que há manuscritos antigos do Novo Testamento em grego que simplesmente não trazem o termo original εἰκῇ/eiké, traduzido em português por “sem razão”, em castelhano por “locamente”, em francês por “sans cause”, em italiano por “senza cagione”, e finalmente em holandês por “onrecht”., será réu de juízo; e qualquer que a seu irmão disser “raca”, será réu do supremo conselho; e qualquer que lhe disser “louco”, será réu do fogo do inferno.
23. Portanto, se trouxeres tua dádiva ao altar, e ali te lembrares que teu irmão tem alguma coisa contra ti;
24. Deixa ali tua dádiva diante do altar, e vai, reconcilia-te primeiro com teu irmão; então vem, e oferece tua dádiva.
25. Entra logo em acordo com teu adversário, enquanto com ele estás no caminho; para que não aconteça que o adversário te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao ministro, e te lancem na prisão.
26. Em verdade te digo que de nenhuma maneira sairás dali, até não pagares o último ceitil.
27. Ouvistes que foi dito pelos antigos: Não adulterarás.
28. Eu porém vos digo que, qualquer que atentar para alguma mulher, para a cobiçar, já adulterou com ela em seu coração.
29. Portanto, se teu olho direito te escandalizar, arranca-o, e lança-o fora de ti; pois melhor te é que um de teus membros se perca, do que todo teu corpo seja lançado no inferno.
30. E se tua mão direita te escandalizar, corta-a, e lança-a fora de ti; pois melhor te é que um de teus membros se perca, do que todo teu corpo seja lançado no inferno.
31. Também foi dito: Qualquer que deixar sua mulher, dê-lhe carta de desquite.
32. Porém eu vos digo que, qualquer que deixar sua mulher, exceto por causa de fornicação, faz com que ela adultere; e qualquer que com a deixada se casar, adultera.
33. Também ouvistes que foi dito pelos antigos: Não perjurarás, mas pagarás ao Senhor teus juramentos.
34. Porém eu vos digo que em maneira nenhuma jureis: nem pelo céu, porque é o trono de Deus;
35. Nem pela terra, porque é o escabelo de seus pés; nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande rei.
36. Nem por tua própria cabeça jurarás, pois nem mesmo um cabelo podes fazer branco, ou preto.
37. Mas seja o vosso falar sim, sim; não, não; porque o que disto passa, do mal procede.
38. Ouvistes que foi dito: Olho por olho, e dente por dente.
39. Mas eu vos digo que não resistais ao mal; antes, a qualquer que te der em tua face direita, vira-lhe também a outra.
40. E ao que contigo pleitear quiser, e tua roupeta te tomar, larga-lhe também a capa.
41. E qualquer que te obrigar a caminhar uma légua, vai com ele duas.
42. Dá a quem te pedir; e a quem de ti quiser tomar emprestado, não te afastes.
43. Ouvistes que foi dito: Amarás a teu próximo, e aborrecerás a teu inimigo.
44. Pois eu vos digo: Amai a vossos inimigos; bendizei aos que vos maldizem; fazei bem aos que vos aborrecem; e rogai pelos que vos maltratam, e vos perseguem.
45. Para que sejais filhos de vosso Pai que está nos céus; porque faz que seu Sol saia sobre maus e bons, e chove sobre justos e injustos.
46. Porque se amardes aos que vos amam, que galardão tereis? Não fazem os publicanos também o mesmo?
47. E se somente saudardes a vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os publicanos também assim?
48. Sede pois vós outros perfeitos, como vosso Pai que está nos céus é perfeito.

Capítulo 6

1. Atentai que não façais vossa esmola perante os homens, para que deles sejais vistos; doutra maneira, não tereis galardão diante de vosso Pai que está nos céus.
2. Portanto, quando deres esmola, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem nas sinagogas e nas ruas os hipócritas, para dos homens serem estimados. Em verdade vos digo que estes já têm seu galardão.
3. Mas quando tu fizeres esmola, não saiba tua mão esquerda o que faz a tua direita;
4. Para que tua esmola seja em oculto; e teu Pai, que vê em oculto, ele mesmo to renderá em público.
5. E quando orares, não sejas como os hipócritas, porque gostam de orar em pé nas sinagogas, e nos cantos das ruas, para dos homens serem vistos. Em verdade vos digo que estes já têm seu galardão.
6. Mas tu, quando orares, entra em tua câmara e, fechando tua porta, ora a teu Pai, que está em oculto; e teu Pai, que vê em oculto, ele to renderá em público.
7. E orando, não useis de palavras vãsA tradução castelhana de base sugere “não sejais prolixos”, e esclarece em nota que tais “palradores” usariam de muitas palavras em suas orações, estudando-as e até decorando-as, mas sem a devida fé. A versão portuguesa, por sua vez, não fala nessa parte específica de “muitas palavras”, mas sim de “palavras vãs”, possivelmente por influência da tradução francesa, que traz “vaines redites”, ou da holandesa, que apresenta “ijdel verhaal van woorden”, que pode ser traduzido em inglês por “vain rehearsal of words”. Aliás, tanto a tradução holandesa como a francesa explicam em nota que o termo grego original βατταλογέω/battalogeó, que aparece uma única vez no Novo Testamento, carrega esse sentido de uma repetição desnecessária de palavras, e sem a devida seriedade ou fervor., como os gentios, que julgam que por seu muito falar hão de ser ouvidos.
8. Não vos façais, pois, semelhantes a eles; pois vosso Pai sabe o que vos é necessário, antes que vós lho peçais.
9. Vós outros, pois, orareis assim: Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome.
10. Venha o teu reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu.
11. O pão nosso de cada dia nos dá hoje.
12. E perdoa-nos nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.
13. E não nos metas em tentação, mas livra-nos do mal; porque teu é o reino, e a potência, e a glória, para todo sempre. Amém.
14. Porque se aos homens perdoardes suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós.
15. Mas se aos homens não perdoardes suas ofensas, tampouco vos perdoará vosso Pai vossas ofensas a vós.
16. E quando jejuardes, não vos mostreis tristonhos, como os hipócritas, que desfiguram seus rostos, para aos homens parecerem que jejuam. Em verdade vos digo que estes já têm seu galardão.
17. Porém tu, quando jejuares, unge tua cabeça e lava teu rosto.
18. Para aos homens não pareceres que jejuas, senão a teu Pai, que está em oculto; e teu Pai, que vê em oculto, ele to renderá em público.
19. Não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a traça, e a ferrugem, tudo corrompe, e onde os ladrões minam e roubam.
20. Mas ajuntai-vos tesouros no céu, onde a traça, e a ferrugem, não corrompe, e onde os ladrões não minam nem roubam.
21. Porque onde vosso tesouro estiver, ali estará também vosso coração.
22. A candeia do corpo é o olho; de modo que, se teu olho for sincero, todo teu corpo será luminoso.
23. Porém se teu olho for maligno, todo teu corpo será tenebroso. Assim que, se a luz que em ti há são trevas, quantas serão as tais trevas!
24. Ninguém pode servir a dois senhores, pois ou há de aborrecer a um, e amar ao outro; ou se há de achegar a um, e desprezar ao outro: não podeis servir a Deus e a Mamom.
25. Portanto, vos digo: não andeis solícitos por vossa vida, pelo que haveis de comer, ou pelo que haveis de beber; nem por vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais que o mantimento, e o corpo mais que a veste?
26. Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e contudo vosso Pai celestial as alimenta. Não sois vós muito melhores que elas?
27. Mas qual de vós outros poderá, com toda sua solicitude, acrescentar um côvado à sua estatura?
28. E pela veste, por que andais solícitos? Atentai para os lírios do campo, como vão crescendo: nem trabalham, nem fiam.
29. E digo-vos que nem mesmo Salomão, com toda sua glória, se vestiu como um deles.
30. Pois se Deus assim veste a erva do campo, que hoje é, e amanhã se lança no forno; não vos vestirá muito mais a vós, ó apoucados na fé?
31. Não andeis pois solícitos, dizendo: Que comeremos? Ou, que beberemos? Ou, com que nos vestiremos?
32. Porque a todas estas coisas buscam os gentios; pois bem sabe vosso Pai celestial que de todas estas coisas necessitais.
33. Mas buscai primeiro o reino de Deus, e sua justiça; e todas estas coisas vos serão acrescentadas.
34. Não andeis, pois, solícitos pelo de amanhã, porque o amanhã terá bom cuidado de si mesmo: basta a cada dia a sua aflição.

Capítulo 7

1. Não julgueis, para que não sejais julgados.
2. Porque com o juízo com que julgardes, sereis julgados; e com a medida com que medirdes, vos tornarão a medir.
3. E por que atentas tu para o argueiro que está no olho de teu irmão; e a trave não enxergas, que em teu olho está?
4. Ou como dirás tu a teu irmão: Deixa-me tirar de teu olho o argueiro; e eis uma trave em teu olho?
5. Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então atentarás em tirar o argueiro do olho de teu irmão.
6. Não deis as coisas santas aos cães, nem lanceis vossas pérolas diante dos porcos; para que com seus pés não as venham a pisar e, virando-se, vos despedacem.
7. Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á.
8. Porque qualquer que pede, recebe; e qualquer que busca, acha; e a qualquer que bate, se lhe abre.
9. E qual de vós será o homem que a seu filho dará uma pedra, pedindo-lhe ele pão?
10. E se lhe pedir peixe, lhe dará uma serpente?
11. Pois se vós, sendo maus, sabeis dar boas dádivas a vossos filhos; quanto mais dará vosso Pai, que está nos céus, bens aos que lhos pedirem?
12. Portanto, tudo o que vós quiserdes que os homens vos façam, fazei-lhos vós também da mesma maneira; porque esta é a Lei, e os profetas.
13. Entrai pela porta estreita; porque a porta larga, e o caminho espaçoso, é o que leva à perdição; e muitos são os que por ele entram.
14. Porque estreita é a porta, e apertado o caminho, que leva à vida; e poucos há que o acham.
15. Porém guardai-vos dos falsos profetas; que vêm a vós outros com vestes de ovelhas, mas por dentro são lobos arrebatadores.
16. Por seus frutos os reconhecereis. Porventura, colhem-se uvas dos espinheiros, ou figos dos abrolhos?
17. Assim, toda boa árvore dá bons frutos; mas a árvore podre dá maus frutos.
18. Não pode a boa árvore dar maus frutos, nem a árvore podre dar bons frutos.
19. Toda árvore que não dá bom fruto se corta, e se lança no fogo.
20. Assim que por seus frutos os reconhecereis.
21. Não é qualquer que me diz “Senhor, Senhor”, que entrará no reino dos céus; mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.
22. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não temos profetizado nós em teu nome? E em teu nome não temos lançado fora os demônios? E em teu nome não fizemos muitas virtudes?
23. E então claramente lhes direiA tradução castelhana de base sugere “então lhes confessarei”, no lugar de “então claramente lhes direi”. Tanto a tradução holandesa como a francesa, ambas consultadas pelo tradutor português, indicam em nota que o verbo grego original ὁμολογέω/homologeó carrega mesmo esse sentido mais literal de “concordância” ou “confissão”; mas optam por uma interpretação talvez mais coerente, pelo contexto da afirmação, de uma declaração “aberta”, isto é, clara e pública – em holandês com o advérbio “openlijk”, termo aparentado com o inglês “openly”, e em francês com o advérbio “ouvertement”, isto é, “abertamente”.: Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, obradores de maldade.
24. Portanto, qualquer que me ouve estas palavras, e as guarda, compará-lo-ei ao varão prudente, que edificou sua casa sobre a penha.
25. E desceu a chuva, e vieram rios, e sopraram ventos, e combateram aquela casa; e não caiu, porque estava fundada sobre a penha.
26. Mas qualquer que me ouve estas palavras, e não as guarda, compará-lo-ei ao varão parvo, que edificou sua casa sobre a areia.
27. E desceu a chuva, e vieram rios, e sopraram ventos, e combateram aquela casa; e caiu, e foi grande sua queda.
28. E aconteceu que, acabando Jesus estas palavras, maravilhavam-se as multidões de sua doutrina.
29. Porque ele os ensinava como quem tem autoridade, e não como os escribas.

Capítulo 8

1. E descendo do monte, seguiram-no muitas multidões.
2. E eis que veio um leproso, e o adorou, dizendo: Senhor, se quiseres, bem me podes limpar.
3. E estendendo Jesus a mão, o tocou, dizendo: Quero, sê limpo! E logo sua lepra foi limpa.
4. Então lhe disse Jesus: Olha que não o digas a ninguém; mas vai, mostra-te ao sacerdote, e oferece a dádiva que Moisés ordenou, para que lhes seja por testemunho.
5. E entrando Jesus em Cafarnaum, veio a ele o centurião, rogando-lhe;
6. E dizendo: Senhor, o meu moço jaz em casa paralítico, gravemente atormentado.
7. E Jesus lhe disse: Eu irei, e o sararei.
8. E respondendo o centurião, disse: Senhor, não sou digno de que entres debaixo de meu telhado. Mas dize somente uma palavra, e meu moço há de sarar.
9. Porque também eu sou homem debaixo de autoridade, e tenho debaixo de mim soldados. E digo a este “vai”, e ele vai; e a outro “vem”, e ele vem; e a meu servo “faze isto”, e ele o faz.
10. E ouvindo Jesus isto, maravilhou-se, e disse aos que o seguiam: Em verdade vos digo que nem mesmo em Israel achei tanta fé.
11. Mas eu vos digo que muitos virão do oriente, e do ocidente, e assentar-se-ão à mesa no reino dos céus com Abraão, e Isaque, e Jacó.
12. E os filhos do reino serão lançados nas trevas, do lado de fora; ali estará o pranto, e o tremor de dentes.
13. Então disse Jesus ao centurião: Vai, e assim como creste, te seja feito. E naquele mesmo instante, ficou seu moço são.
14. E vindo Jesus à casa de Pedro, viu a sua sogra deitada, e com febre.
15. E tocou-lhe na mão, e a febre a deixou; e levantou-se ela, e servia-os.
16. E como já era tarde, trouxeram-lhe muitos endemoninhados; e lançou-lhes fora os espíritos malignos com a palavra, e sarou a todos os que se achavam mal.
17. Para que se cumprisse o que estava dito pelo profeta Isaías, que disse: Ele tomou nossas enfermidades, e levou sobre si nossas doenças.
18. E vendo Jesus uma grande multidão ao redor de si, mandou que passassem do outro lado.
19. E chegando-se um escriba a ele, disse-lhe: Mestre, aonde quer que fores, te seguirei.
20. E Jesus lhe disse: As raposas têm covis, e as aves do céu, ninhos. Mas o Filho do homem não tem onde recostar a cabeça.
21. E outro de seus discípulos lhe disse: Senhor, dá-me licença para que eu vá primeiro enterrar a meu pai.
22. E Jesus lhe disse: Segue-me tu a mim, e deixa aos mortos o enterrar seus mortos.
23. E entrando ele no barco, seus discípulos o seguiram.
24. E eis que se levantou uma tão grande tormenta no mar, que o barco se cobria das ondas; e ele estava dormindo.
25. E chegando seus discípulos, o acordaram, dizendo: Senhor, salva-nos, pois nos perdemos!
26. E ele lhes disse: Por que temeis, ó apoucados na féA opção por “apoucados na fé” soa como tentativa deliberada de exprimir em português mais fiel e sinteticamente o valor adjetivo do termo grego original ὀλιγόπιστος/oligopistos; uma vez que as versões bíblicas consultadas pelo tradutor geralmente acrescentam ao adjetivo o substantivo correspondente a “homens” ou “gente”, como no castelhano “hombres de poca fe”, no francês “gens de petite foi”, ou no italiano “uomini di poca fede”. Assim, a tradução portuguesa parece ter sido influenciada aqui diretamente pela Bíblia holandesa, que traz apenas “gij kleingelovigen”, que pode ser traduzido em inglês por “you of little faith”, isto é, “vós de pouca fé”, eximindo-se assim da necessidade de acrescentar mais palavras, ao buscar exprimir o sentido do termo grego original.? Então levantando-se, repreendeu aos ventos, e ao mar; e houve grande bonança.
27. E os homens se maravilharam, dizendo: Quem é este, que até os ventos e o mar lhe obedecem?
28. E tendo passado para o outro lado, à província dos gergesenos, vieram-lhe ao encontro dois endemoninhados; os quais saíam dos sepulcros tão ferozes, que ninguém podia passar por aquele caminho.
29. E eis que clamaram, dizendo: Que temos contigo, ó Jesus, filho de Deus!? Vieste aqui para nos atormentar antes do tempo?
30. E estava uma grande manada de porcos longe deles, pastando.
31. E os diabos lhe rogaram, dizendo: Se nos lançares fora, permite-nos que entremos naquela manada de porcos.
32. E disse-lhes: Ide. E saindo eles, entraram na manada de porcos; e eis que toda aquela manada de porcos se precipitou no mar, e morreram nas águas.
33. Então os porqueiros fugiram; e vindo à cidade, contaram todas estas coisas, e o que acontecera aos endemoninhados.
34. E eis que toda aquela cidade saiu ao encontro de Jesus; e vendo-o, rogaram-lhe que se retirasse de seus termos.

Capítulo 9

1. Então entrando no barco, passou do outro lado, e veio à sua própria cidade. E eis que lhe trouxeram um paralítico, deitado em um leito.
2. E vendo Jesus a fé deles, disse ao paralítico: Tem bom ânimo, filho; teus pecados te são perdoados.
3. E eis que alguns dos escribas diziam dentro de si mesmos: Este blasfema!
4. Mas vendo Jesus seus pensamentos, disse: Por que pensais o mal em vossos corações?
5. Que é mais fácil? Dizer “teus pecados te são perdoados”, ou dizer “levanta-te, e anda”?
6. Ora, para que saibais que o Filho do homem tem autoridade na terra para perdoar pecados – disse então ao paralítico: Levanta-te, e toma teu leito, e vai-te para tua casa.
7. Então levantou-se, e foi-se para sua casa.
8. E vendo as multidões isto, maravilharam-se, e glorificaram a Deus, que tal autoridade tivesse dado aos homens.
9. E passando Jesus dali, viu a um homem assentado na alfândega, o qual se chamava Mateus. E disse-lhe: Segue-me. E levantando-se ele, seguiu-o.
10. E aconteceu que, estando Jesus assentado em casa de Mateus à mesa, eis que vieram muitos publicanos e pecadores, e assentaram-se juntamente à mesa com Jesus e seus discípulos.
11. E vendo isto os fariseus, disseram a seus discípulos: Por que come o vosso mestre com os publicanos e pecadores?
12. E ouvindo Jesus aquilo, disse-lhes: Os que têm saúde não necessitam de médico, senão os que estão doentes.
13. Mas ide, e aprendei que coisa é “misericórdia quero, e não sacrifício”. Porque eu não vim a chamar os justos, senão os pecadores, a que se convertam.
14. Então vieram a ele os discípulos de João, dizendo: Por que nós, e também os fariseus, jejuamos muitas vezes, e teus discípulos não jejuam?
15. E Jesus lhes disse: Porventura podem os que estão de bodas andar tristonhos, enquanto o esposo com eles está? Mas dias virão, quando o esposo lhes for tirado, e então jejuarão.
16. Também ninguém deita remendo de pano novo em veste velha; porque o tal remendo tira da veste, e faz-se uma pior rotura.
17. Nem deitam o vinho novo em odres velhos; doutra maneira, os odres se rompem, e o vinho se derrama, e os odres se perdem. Mas deitam o vinho novo em odres novos, e ambos juntamente se conservam.
18. E dizendo ele estas coisas, eis que veio um principal, e o adorou, dizendo: Minha filha faleceu ainda agora. Mas vem, e põe tua mão sobre ela, e viverá.
19. E levantando-se Jesus, o seguiu, e também seus discípulos.
20. E eis que uma mulher, enferma de um fluxo de sangue, tido havia já doze anos, veio por detrás, e tocou a borda de sua veste.
21. Porque dizia em si mesma: Se eu tão somente tocar sua veste, ficarei sã.
22. Então virando-se Jesus, e vendo-a, disse: Tem bom ânimo, filha; tua fé te salvou. E desde o mesmo instante, ficou a mulher sã.
23. E vindo Jesus à casa daquele principal, e vendo os tangedores das flautas, e o povo que fazia grande alvoroço;
24. Disse-lhes: Afastai-vos, porque a moça não está morta, mas dorme. E zombavam dele.
25. E tendo a multidão sido lançada fora, entrou, e pegou-lhe pela mão; e a moça se levantou.
26. E correu esta fama por toda aquela terra.
27. E passando Jesus dali, seguiram-no dois cegos bradando, e dizendo: Tem compaixão de nós, ó filho de Davi!
28. E vindo à casa, vieram os cegos a ele. E disse-lhes Jesus: Credes vós que posso fazer isto? Eles lhe disseram: Sim, Senhor.
29. Então lhes tocou os olhos, dizendo: Conforme a vossa fé se vos faça!
30. E os olhos se lhes abriram. E Jesus censurava-os rigorosamente, dizendo: Olhai que não o saiba ninguém.
31. Mas havendo eles saído, divulgaram sua fama por toda aquela terra.
32. E saindo eles, eis que lhe trouxeram um homem mudo, e endemoninhado.
33. E sendo o diabo lançado fora, falou o mudo. E as multidões se maravilhavam, dizendo: Nunca tal se viu em Israel.
34. Mas os fariseus diziam: Pelo príncipe dos demônios, lança fora aos demônios!
35. E Jesus rodeava por todas as cidades e aldeias, ensinando em suas sinagogas, e pregando o evangelho do reino; e sarando toda enfermidade, e todo mal entre o povo.
36. E vendo as multidões, moveu-se de íntima compaixão por elas; porque andavam desgarradas, e espalhadas como ovelhas que não têm pastor.
37. Então disse a seus discípulos: Grande é, em verdade, a seara; porém são poucos os obreiros.
38. Pelo que rogai ao Senhor da seara, que empurre obreiros à sua searaEm lugar de “empurre obreiros”, a tradução castelhana de base traz no corpo do texto “envíe obreros”, embora esclareça em nota que o verbo grego original ἐκβάλλω/ekballo significa mais propriamente “lançar fora, como que por empurrões”. Ao optar assim por um sentido mais literal, a tradução portuguesa pode ter sido influenciada também pelas Bíblias francesa, italiana ou holandesa, uma vez que todas estas trazem, em seus respectivos idiomas, verbos mais próximos do português “empurrar” ou “expulsar”, do que simplesmente “enviar”: a francesa apresenta “qu'il pousse des ouvriers”, a italiana “ch’egli spinga degli operai”, e a holandesa “dat Hij arbeiders uitstote”..

Capítulo 10

1. Então chamando a si aos seus doze discípulos, deu-lhes poder sobre os espíritos imundos, para os lançarem fora, e sararem toda enfermidade e toda fraqueza.
2. Ora, os nomes dos doze apóstolos são estes: o primeiro, Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão; Tiago, o filho de Zebedeu, e João, seu irmão.
3. Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, o filho de Alfeu, e Lebeu, também chamado o Tadeu.
4. Simão, cananeu, e Judas Iscariotes, que depois também o entregou.
5. A estes doze enviou Jesus, e lhes mandou, dizendo: Pelo caminho das gentes não ireis, nem em cidade alguma de samaritanos entrareis.
6. Mas ide antes às ovelhas perdidas da casa de Israel.
7. E indo, pregai, dizendo: Próximo está o reino dos céus.
8. Sarai os enfermos, limpai os leprosos, ressuscitai os mortos, lançai fora os demônios: de graça o recebestes, dai-o de graça.
9. Não possuais ouro, nem prata, nem dinheiro em vossas cintas;
10. Nem alforges para o caminho, nem duas vestes, nem sapatos, nem bordão; porque digno é o obreiro do seu alimento.
11. E em qualquer cidade ou aldeia em que entrardes, informai-vos de quem nela seja dignoA tradução castelhana sugere “buscai com diligência” no lugar de “informai-vos”. O verbo grego nesse caso é bastante específico – ἐξετάζω/exetazó –, aparecendo apenas três vezes em todo o Novo Testamento. A opção portuguesa por “informai-vos” parece fazer jus a essa especificidade do termo grego original, seja por influência da tradução francesa, que traz “enquérez-vous”; ou da italiana, que traz “ricercate”; ou do holandês “onderzoekt”, termo aparentado com o inglês “underseek” – verbos estes que podem ser traduzidos em português por “inquirir”, “examinar”, “pesquisar”,“investigar”, etc.; e pousai ali, até que saiais.
12. E quando entrardes em alguma casa, saudai-a.
13. E se a casa for digna, venha sobre ela vossa paz; porém se digna não for, torne-se vossa paz a vós outros.
14. E qualquer que não vos receber, nem vossas palavras ouvir, saindo daquela casa ou cidade, sacudi o pó dos vossos pés.
15. Em verdade vos digo que mais tolerável será aos da terra de Sodoma e Gomorra, no dia do juízo, do que àquela cidade.
16. Eis que eu vos envio como a ovelhas no meio de lobos. Portanto, sede prudentes como serpentes, e símplices como pombas.
17. E guardai-vos dos homens; porque vos entregarão em concílios, e vos açoitarão em suas sinagogas.
18. E até ante presidentes e reis sereis levados, por causa de mim; para que a eles e aos gentios lhes seja em testemunho.
19. Mas quando vos entregarem, não andeis solícitos acerca de como ou de que falareis; porque naquele mesmo instante vos será dado o que haveis de falar.
20. Porque não sois vós os que falais, mas é o Espírito de vosso Pai que em vós fala.
21. Ora, o irmão entregará à morte ao irmão, e o pai, ao filho; e os filhos se levantarão contra os pais, e os matarão.
22. E por todos sereis aborrecidos por causa do meu nome; mas aquele que perseverar até o fim, esse será salvo.
23. Mas quando vos perseguirem nesta cidade, fugi para a outra; porque em verdade vos digo que não acabareis de percorrer as cidades de Israel, sem que venha o Filho do homem.
24. O discípulo não é mais do que seu mestre, nem o servo mais do que seu senhor.
25. Basta-lhe ao discípulo ser como seu mestre, e ao servo como seu senhor. Se até ao próprio pai da família chamaram Belzebu, quanto mais a seus domésticos?
26. De modo que não os temais; porque nada há encoberto que não se haja de revelar, e nada há oculto que não se haja de saber.
27. O que eu vos digo em trevas, dizei-o em luz; e o que ouvirdes ao ouvido, pregai-o dos telhados.
28. E não temais aos que matam o corpo, mas não podem matar a alma; temei antes àquele que pode destruir tanto a alma como o corpo no inferno.
29. Não se vendem dois passarinhos por um ceitil? E nenhum deles cairá em terra sem vosso Pai.
30. E até vossos cabelos da cabeça todos também estão contados.
31. Não temais, pois: mais valeis vós que muitos passarinhos.
32. Portanto, qualquer que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai que está nos céus.
33. E qualquer que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai que está nos céus.
34. Não julgueis que vim a trazer paz na terra; não vim a trazer paz, senão cutelo.
35. Porque eu vim a fazer dissensão do homem contra seu pai, e da filha contra sua mãe, e da nora contra sua sogra.
36. E serão os inimigos do homem os que são de sua própria casa.
37. Quem ama pai ou mãe mais que a mim, não é digno de mim; e quem ama filho ou filha mais que a mim, não é digno de mim.
38. E quem não tomar sua cruz, e seguir após mim, não é digno de mim.
39. Quem achar sua alma, perdê-la-á; e quem perder sua alma por causa de mim, achá-la-á.
40. Quem a vós vos recebe, a mim me recebe; e quem a mim me recebe, recebe àquele que me enviou.
41. Quem recebe profeta, em nome de profeta, galardão de profeta receberá; e quem recebe justo, em nome de justo, galardão de justo receberá.
42. E qualquer que tão somente der um púcaro de água fria a um destes pequeninos, em nome de discípulo, em verdade vos digo que não perderá seu galardão.

Capítulo 11

1. E sucedeu que, acabando Jesus de dar mandamentos a seus doze discípulos, foi-se dali a ensinar e a pregar nas cidades deles.
2. E ouvindo João na prisão as obras de Cristo, mandou-lhe dois de seus discípulos,
3. Dizendo: És tu aquele que havia de vir, ou esperamos a outro?
4. E respondendo Jesus, disse-lhes: Ide, anunciai a João as coisas que ouvis e vedes:
5. Os cegos vêem, e os mancos andam; os leprosos são limpos, e os surdos ouvem; os mortos são ressuscitados, e aos pobres é anunciada a alegre nova.
6. E bem-aventurado é aquele que em mim não se escandalizar.
7. E tendo eles ido, começou Jesus a dizer acerca de João às multidões: Que saístes a ver no deserto? Alguma cana que se abala com o vento?
8. Ou que saístes a ver? Um homem coberto com vestes brandas? Eis que os que trazem vestes brandas, nas casas dos reis estão.
9. Ou que saístes a ver? Um profeta? Também vos digo, e ainda mais que um profeta.
10. Porque este é aquele de quem está escrito: Eis que diante de tua face envio a meu anjo, o qual preparará teu caminho diante de ti.
11. Em verdade vos digo que, dentre os que de mulheres são nascidos, outro não se levantou maior que João, o Batista; mas aquele que no reino dos céus é o menor, maior é que ele.
12. E desde os dias de João, o Batista, até agora, se faz força ao reino dos céus, e os valentes o arrebatam.
13. Porque todos os profetas, e a Lei também, até João profetizaram.
14. E se o quereis receber, ele é Elias, o qual havia de vir.
15. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.
16. Mas a quem compararei esta geração? Semelhante é aos rapazes que se assentam nas praças, e dão gritos a seus companheiros.
17. E dizem: Tangemo-vos com gaita, e não bailastes; cantamo-vos lamentações, e não pranteastes.
18. Porque veio João, nem comendo nem bebendo, e dizem: Demônio tem!
19. Veio o Filho do homem, comendo e bebendo, e dizem: Eis aqui um homem comilão e beberrão, amigo de publicanos e pecadores! Mas a sabedoria é justificada por seus filhos.
20. Então começou ele a lançar em rosto às cidades em que muitas de suas maravilhas se fizeram, pois não se tinham arrependido:
21. Ai de ti Corazim, ai de ti Betsaida! Porque se em Tiro e em Sidom fossem feitas as maravilhas que em vós se fizeram, muito há que se teriam arrependido com saco e com cinza.
22. Portanto eu vos digo que mais tolerável será para Tiro e Sidom, no dia do juízo, que para vós outras.
23. E tu, ó Cafarnaum, que até os céus estás levantada, até os infernos serás rebaixada; porque se entre os de Sodoma fossem feitas as maravilhas que em ti se fizeram, até o dia de hoje teriam permanecido.
24. Portanto, eu vos digo que mais tolerável será para os de Sodoma, no dia do juízo, que para ti.
25. Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que escondeste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos meninos.
26. Assim é, ó Pai, porque assim te agradou aos teus olhos.
27. Todas as coisas me estão entregues por meu Pai; e ninguém conheceu ao Filho, senão o Pai; nem ninguém conheceu ao Pai, senão o Filho, e mais a quem o Filho o quiser revelar.
28. Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos farei descansar.
29. Levai sobre vós meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para vossas almas.
30. Porque o meu jugo é brandoEm vez de “o meu jugo é brando”, a tradução castelhana de base sugere “o meu jugo é fácil”, acrescentando em nota “fácil de ser levado”. Ao optar por “brando”, a versão portuguesa parece ter sido influenciada pelo adjetivo holandês “zacht”, termo aparentado com o inglês “soft”, isto é”, “suave”, “macio”, “agradável”, “ameno”, etc. Tal opção pode ter advindo também de alguma influência da Vulgata latina, que traz “suave”. Seja como for, a opção por “brando” reflete muito bem a particularidade do adjetivo grego χρηστός/chréstos, que aparece geralmente no Novo Testamento associado a conceitos como bondade, brandura, benevolência, seja de Deus para com os homens, seja de uns para com os outros., e leve a minha carga.

Capítulo 12

1. Naquele tempo, ia Jesus por uns semeados no sábado; e seus discípulos tinham fome, e começaram a arrancar espigas, e a comer.
2. E vendo isto os fariseus, disseram-lhe: Eis que teus discípulos fazem o que não é lícito fazer no sábado.
3. E ele lhes disse: Não tendes lido o que fez Davi, tendo fome, ele e os que com ele estavam?
4. Como entrou na Casa de Deus, e comeu os pães da proposição, que a ele lhe não era lícito comer, nem aos que com ele estavam, senão só aos sacerdotes?
5. Ou não tendes lido na Lei como nos sábados, no templo profanam os sacerdotes o sábado, e ficam sem culpa?
6. Pois eu vos digo que um maior que o templo está aqui.
7. Mas se vós soubésseis que coisa é “misericórdia quero, e não sacrifício”, vós não condenaríeis aos inocentes.
8. Porque até do sábado, é o Filho do homem senhor.
9. E partindo-se dali, veio à sinagoga deles.
10. E eis que havia ali um homem que tinha uma mão ressequida. E perguntaram-lhe, dizendo: É lícito curar no sábado? E isto para o acusarem.
11. E ele lhes disse: Qual homem dentre vós outros haverá que, tendo uma ovelha, e se esta cair numa cova no sábado, não a agarrará, e a levantará?
12. Pois quanto mais vale um homem que uma ovelha? Assim que lícito é fazer o bem nos sábados.
13. Então disse àquele homem: Estende tua mão. E ele a estendeu, e foi-lhe restituída sã, como a outra.
14. E tendo saído os fariseus, consultaram contra ele, para o matarem.
15. Mas sabendo-o Jesus, retirou-se dali; e seguiram-no muitas multidões, e sarava-os a todos.
16. E censurava-os rigorosamente, para que o não descobrissem.
17. Para que se cumprisse o que estava dito pelo profeta Isaías, que disse:
18. Eis aqui meu servo, a quem escolhi, meu amado, em quem minha alma se agrada; sobre ele porei meu Espírito, e às gentes anunciará juízo.
19. Não contenderá nem vozeará, nem ninguém sua voz pelas ruas ouvirá.
20. A cana trilhada não quebrantará, e o pavio que fumega não apagará, até que o juízo tire em vitória.
21. E em seu nome esperarão as gentes.
22. Então lhe trouxeram um endemoninhado, cego e mudo; e de tal maneira o sarou, que o cego e mudo falava e via.
23. E todas as multidões estavam fora de si, e diziam: Não é este aquele filho de Davi?
24. Mas tendo ouvido os fariseus isto, diziam: Este não lança fora os demônios senão por Belzebu, o príncipe dos demônios!
25. E como Jesus sabia os pensamentos deles, disse-lhes: Todo reino contra si mesmo dividido se assola; e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não permanecerá.
26. E se Satanás lança fora a Satanás, contra si mesmo está dividido; como permanecerá, logo, seu reino?
27. E se eu, por Belzebu, lanço fora aos demônios, por quem os lançam então os vossos filhos? Portanto, eles mesmos serão os vossos juízes.
28. Mas se eu, pelo Espírito de Deus, lanço fora aos demônios, em verdade que chegado é a vós outros o reino de Deus.
29. Porque como pode alguém entrar na casa do valente, e saquear seu fato, se primeiro não prender ao valente? E só então saqueará sua casa.
30. Quem comigo não é, é contra mim; e quem comigo não ajunta, espalha.
31. Portanto eu vos digo: Todo pecado e blasfêmia se perdoará aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito não se perdoará aos homens.
32. E qualquer que falar contra o Filho do homem, ser-lhe-á perdoado; mas qualquer que falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste século, nem no vindouro.
33. Ou fazei a árvore boa, e seu fruto bom; ou fazei a árvore podre, e seu fruto podre; porque pelo fruto se reconhece a árvore.
34. Raça de víboras! Como podeis vós falar o bem, sendo maus? Porque da abundância do coração, fala a boca.
35. O bom homem tira boas coisas do bom tesouro de seu coração; e o mau homem, do mau tesouro, tira más coisas.
36. Mas eu vos digo que, de toda palavra vã que os homens falarem, dela darão conta no dia do juízo.
37. Porque por tuas palavras serás justificado, e por tuas palavras serás condenado.
38. Então responderam uns dos escribas e dos fariseus, dizendo: Mestre, quiséramos ver de ti algum sinal.
39. E ele respondeu, e disse-lhes: A má geração e adulterina pede um sinal; mas sinal se lhe não dará, senão o sinal de Jonas, o profeta.
40. Porque assim como Jonas esteve três dias e três noites no ventre da baleia, assim estará também o Filho do homem três dias e três noites no coração da terra.
41. Os de Nínive se levantarão em juízo com esta geração, e a condenarão; porque com a pregação de Jonas se arrependeram, e eis que mais que Jonas está aqui.
42. A rainha do austro se levantará em juízo com esta geração, e a condenará; porque veio dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão, e eis que mais que Salomão está aqui.
43. Quando o espírito imundo é saído do homem, anda por lugares secos, buscando repouso; e não o acha.
44. Então diz: Tornar-me-ei à minha casa, donde saí. E quando vem, acha-a desocupada, varrida e adornada.
45. Então vai, e toma consigo outros sete espíritos, piores que ele; e tendo entrado, moram ali; e são as coisas derradeiras do tal homem piores que as primeiras. Assim acontecerá também a esta má geração.
46. E estando ele ainda falando às multidões, eis que estavam sua mãe e também seus irmãos fora, que lhe queriam falar.
47. E disse-lhe um: Eis que ali fora estão tua mãe e também teus irmãos, que te querem falar.
48. E respondendo ele ao que isto lhe dizia, disse: Quem é minha mãe? E quem são meus irmãos?
49. E estendendo sua mão para seus discípulos, disse: Eis aqui minha mãe, e também meus irmãos.
50. Porque todo aquele que fizer a vontade de meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, e irmã, e mãe.

Capítulo 13

1. E saindo Jesus de casa aquele dia, assentou-se junto ao mar.
2. E chegaram-se a ele tantas multidões, que entrando num barco, assentou-se nele; e todo o povo estava na praia.
3. E falou-lhes muitas coisas por parábolas, dizendo: Eis que o semeador saiu a semear.
4. E semeando ele, caiu uma parte da semente junto ao caminho; e vieram as aves, e comeram-na.
5. E outra parte caiu em pedregais, onde não havia muita terra; e logo nasceu, porque não tinha terra profunda.
6. Mas saindo o sol, queimou-se; e porque não tinha raiz, secou-se.
7. E outra parte caiu entre espinhos; e os espinhos cresceram, e sufocaram-na.
8. E outra parte caiu em boa terra; e deu fruto, de um até cento, de outro até sessenta, e de outro até trinta.
9. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.
10. Então, chegando-se os discípulos, disseram-lhe: Por que lhes falas por parábolas?
11. E respondendo ele, disse-lhes: Porque a vós é concedido saber os mistérios do reino dos céus; mas a eles não lhes é concedido.
12. Porque a qualquer que tem, ser-lhe-á dado, e terá mais; mas ao que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado.
13. Por isso eu lhes falo por parábolas; porque vendo, não vêem; e ouvindo, não ouvem, nem entendem.
14. E neles se cumpre a profecia de Isaías, que diz: De ouvido ouvireis, e não entendereis; e vendo vereis, e não enxergareis.
15. Porque o coração deste povo está engrossado, e ouvem pesadamente com os ouvidos, e toscanejam com os olhos; para que não vejam com os olhos, e ouçam com os ouvidos, e entendam com o coração, e se convertam, e eu os sare.
16. Mas bem-aventurados os vossos olhos, porque vêem; e os vossos ouvidos, porque ouvem.
17. Porque em verdade vos digo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vós vedes, e não o viram; e ouvir o que vós ouvis, e não o ouviram.
18. Ouvi, pois, vós outros a parábola do semeador:
19. Ouvindo alguém a palavra do reino, e não a entendendo, vem o maligno e arrebata o que em seu coração foi semeado: este é o que foi semeado junto ao caminho.
20. E o que foi semeado em pedregais, este é o que ouve a palavra, e logo a recebe com regozijo.
21. Mas não tem raiz em si; antes, é temporal; de modo que, vinda a aflição, ou a perseguição pela palavra, logo se ofende.
22. E o que foi semeado entre espinhos, este é o que ouve a palavra, mas o cuidado deste mundo, e o engano das riquezas, sufocam a palavra, e fica sem fruto.
23. Mas o que foi semeado em boa terra, este é o que ouve e entende a palavra, e o que dá fruto; e dá de um cento, e de outro sessenta, e de outro trinta.
24. Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante ao homem que semeia boa semente em seu campo.
25. Mas dormindo os homens, veio seu inimigo, e semeou cizânia entre o trigo; e foi-se.
26. E como a erva saiu e deu fruto, então apareceu também a cizânia.
27. E chegando-se os servos do pai da família, disseram-lhe: Senhor, não semeaste tu boa semente em teu campo? Donde lhe vem, pois, a cizânia?
28. E ele lhes disse: O homem inimigo fez isto. E os servos lhe disseram: Queres, logo, que vamos, e a colhamos?
29. E ele lhes disse: Não, para que, colhendo a cizânia, não arranqueis também juntamente com ela o trigo.
30. Deixai crescer juntos um e outro, até a sega; e ao tempo da sega, direi aos segadores: Colhei primeiro a cizânia, e atai-a em molhos, para a queimar; mas o trigo, recolhei-o no meu celeiro.
31. Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante ao grão da mostarda, que tomando-o alguém, o semeou em seu campo.
32. O qual, em verdade, é a menor de todas as sementes; mas crescendo, é a maior de todas as hortaliças. E faz-se tamanha árvore, que vêm as aves do céu, e fazem ninhos em seus ramos.
33. Outra parábola lhes disse: Semelhante é o reino dos céus ao fermento que, tomando-o a mulher, esconde-o em três medidas de farinha, até que tudo esteja levedado.
34. Tudo isto falou Jesus por parábolas às multidões; e nada lhes falou sem parábolas.
35. Para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta, que disse: Em parábolas abrirei minha boca; brotarei coisas escondidas desde a fundação do mundoA opção portuguesa por “brotarei coisas escondidas” parece ter advindo de consulta à tradução francesa de referência; pois esta esclarece em nota que o verbo grego ἐρεύγομαι/ereugomai, que aparece essa única vez em todo o Novo Testamento, carrega o sentido metafórico de uma fonte que jorra suas águas com impetuosidade. Isso porque a versão castelhana traz “regoldaré cosas escondidas”, sugerindo algo como “regurgitar”, ou mesmo “eructar” ou “arrotar”. A tradução holandesa, por sua vez, pode ter exercido também alguma influência; pois embora traga no corpo do texto o verbo “voortbrengen” – análogo ao inglês “forthbring” ou “bring forth”, isto é, “produzir” –, sugere também em nota a metáfora de uma fonte, que “borbulha” muitas águas..
36. Então despedidas as multidões, veio-se Jesus para casa. E chegando-se seus discípulos a ele, disseram-lhe: Declara-nos a parábola da cizânia do campo.
37. E respondendo ele, disse-lhes: O que semeia a boa semente é o Filho do homem.
38. E o campo é o mundo; e a boa semente, estes são os filhos do reino; e a cizânia, estes são os filhos do maligno.
39. E o inimigo, que a semeou, é o diabo; e a sega é o fim do mundo; e os segadores são os anjos.
40. De maneira que, assim como a cizânia é colhida, e queimada a fogo, assim será no fim do mundo.
41. Mandará o Filho do homem a seus anjos, e colherão todos os estorvos de seu reino, e aos que obram iniquidade.
42. E lançá-los-ão no forno do fogo; ali estará o choro, e o bater de dentes.
43. Então resplandecerão os justos como o Sol, no reino de seu Pai. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.
44. Outrossim, semelhante é o reino dos céus ao tesouro escondido num campo, que achando-o o homem, o encobre; e pelo regozijo dele vai, e vende tudo quanto tem, e compra aquele campo.
45. Semelhante também é o reino dos céus ao homem mercador, que busca boas pérolas;
46. O qual, achando uma pérola preciosa, foi, e vendeu tudo quanto tinha, e comprou-a.
47. Do mesmo modo, semelhante é o reino dos céus à rede que, lançada ao mar, colhe de toda sorte de peixes.
48. E estando já cheia, os pescadores puxam-na à praia; e assentados, recolhem o bom nos seus vasos, e o mau lançam fora.
49. Assim será no fim do século: sairão os anjos, e apartarão os maus dentre os justos.
50. E lançá-los-ão no forno de fogo; ali estará o choro, e o bater de dentes.
51. E disse-lhes Jesus: Entendestes todas estas coisas? Responderam eles: Sim, Senhor.
52. E ele lhes disse: Portanto, todo escriba douto no reino dos céus é semelhante a um pai de família, que do seu tesouro tira coisas novas e velhas.
53. E aconteceu que, acabando Jesus estas parábolas, retirou-se dali.
54. E vindo à sua pátria, ensinava-os na sinagoga deles. De tal maneira que estavam fora de si, e diziam: Donde lhe vem a este esta sabedoria, e estas maravilhas?
55. Não é este o filho do carpinteiro? Não se chama sua mãe Maria, e seus irmãos Tiago, e José, e Simão, e Judas?
56. E não estão todas suas irmãs conosco? Donde lhe vem, logo, a este tudo isto?
57. E escandalizavam-se nele. Mas Jesus lhes disse: Não há profeta sem honra, exceto em sua pátria, e em sua casa.
58. E não fez ali muitas virtudes, por causa da incredulidade deles.

Capítulo 14

1. Naquele tempo, ouviu Herodes, o tetrarca, a fama de Jesus.
2. E disse a seus criados: Este é João Batista; já ressurgiu dos mortos, e por isso operam nele estas virtudes.
3. Porque Herodes prendera a João; e o havia atado e posto na prisão por causa de Herodias, mulher de seu irmão Filipe.
4. Porque João lhe dizia: Não te é lícito tê-la.
5. E querendo matá-lo, temia o povo; porque tinham-no como profeta.
6. E celebrando-se o dia do nascimento de Herodes, dançou a filha de Herodias no meio deles; e agradou a Herodes.
7. Pelo que prometeu, com juramento, dar-lhe tudo quanto pedisse.
8. E ela, instruída primeiro por sua mãe, disse: Dá-me aqui num prato a cabeça de João Batista.
9. Então entristeceu-se o rei; mas pelo juramento, e pelos que juntamente estavam à mesa, mandou que se lhe desse.
10. E mandou degolar a João na prisão.
11. E foi sua cabeça trazida num prato, e dada à moça; e ela a apresentou à sua mãe.
12. Então chegaram seus discípulos, e tomaram o corpo, e enterraram-no; e foram, e deram as novas a Jesus.
13. E ouvindo-o Jesus, retirou-se dali num barco a um lugar deserto, afastado; e ouvindo-o as multidões, seguiram-no a pé desde as cidades.
14. E saindo Jesus, viu uma grande multidão; e moveu-se de íntima compaixão por eles, e sarou os que dentre eles estavam enfermos.
15. E como já entardecia, chegaram-se a ele seus discípulos, dizendo: O lugar é deserto, e o tempo já tem passado; manda às multidões que se vão pelas aldeias, e comprem para si de comer.
16. E Jesus lhes disse: Não têm necessidade de irem-se; dai-lhes vós mesmos de comer.
17. E eles disseram: Não temos aqui mais que cinco pães, e dois peixes.
18. E ele lhes disse: Trazei-mos aqui.
19. E mandando às multidões que se assentassem pela erva, e tomando os cinco pães e os dois peixes, e levantando os olhos ao céu, abençoou-os; e partindo os pães, deu-os aos discípulos, e os discípulos às multidões.
20. E comeram todos, e fartaram-se; e levantaram ainda, do que sobejou dos pedaços, doze alcofas cheias.
21. E os que comeram eram quase cinco mil varões, afora as mulheres e os meninos.
22. E logo Jesus fez entrar no barco a seus discípulos, e que fossem diante dele para a outra margem, enquanto despedia as multidões.
23. E tendo já despedido as multidões, subiu ao monte, afastado, para orar. E quando já se tinha feito tarde, estava ali só.
24. E já o barco estava no meio do mar, atormentado pelas ondas; porque o vento era contrário.
25. Mas à quarta vela da noite, foi Jesus até eles, andando sobre o mar.
26. E vendo-o os discípulos andar sobre o mar, perturbaram-se, dizendo: Um fantasma é! E deram gritos de tanto medo.
27. Mas Jesus logo lhes falou, dizendo: Tende bom ânimo, sou eu! Não tenhais medo.
28. Então lhe respondeu Pedro, e disse: Senhor, se és tu mesmo, manda que eu vá a ti sobre as águas.
29. E ele disse: Vem! E descendo Pedro do barco, andou sobre as águas, para ir até Jesus.
30. Mas vendo o vento forte, teve medo; e começando-se a afundar, deu gritos, dizendo: Senhor, salva-me!
31. E estendendo Jesus logo a mão, pegou-o, e disse-lhe: Ó apoucado na fé! Por que duvidaste?
32. E assim que entraram no barco, o vento se aquietou.
33. Então vieram os que estavam no barco, e adoraram-no, dizendo: Verdadeiramente és filho de Deus!
34. E chegando à outra margem, vieram à terra de Genesaré.
35. E assim que os varões daquele lugar o reconheceram, mandaram por toda aquela terra ao redor, e trouxeram-lhe todos os enfermos.
36. E rogavam-lhe que tão somente tocassem a borda de sua veste; e todos os que a tocavam, ficavam sãos.

Capítulo 15

1. Então se chegaram a Jesus certos escribas e fariseus de Jerusalém, dizendo:
2. Por que teus discípulos transgridem a tradição dos anciãos? Pois não lavam as mãos quando comem pão.
3. E respondendo ele, disse-lhes: Por que vós outros transgredis também o mandamento de Deus por vossa própria tradição?
4. Porque Deus mandou, dizendo: Honra ao teu pai e à tua mãe. E também quem amaldiçoar ao pai ou à mãe, morra de morte.
5. Mas vós outros dizeis: Qualquer que disser ao pai ou à mãe: É oferta tudo o que de mim te puder aproveitar – e de nenhuma maneira honrará a seu pai ou à sua mãe –, aquele satisfaz a LeiAs palavras “aquele satisfaz (a Lei)” são acrescentadas aqui por influência da Bíblia holandesa, que traz “die voldoet”, isto é, “aquele satisfaz” ou “aquele cumpre” – sendo o verbo holandês “vol+doen” equivalente ao inglês “full+do”, isto é, “perfazer”, “completar”, “cumprir”, etc. Tal sentença não aparece em qualquer texto grego de referência, mas é adicionada à tradução para explicar melhor o sentido do argumento, isto é, o de que mesmo se alguém deixasse de honrar pai ou mãe, segundo a tradição dos escribas e fariseus, este satisfaria sim a Lei, isto é, ficaria sem culpa. A tradução francesa consultada, por sua vez, sugere a adição de “ficará sem culpa”, ao passo que as versões castelhana e italiana optam por uma tradução do texto grego mais literal, sem lhe acrescentarem qualquer sentença explicativa..
6. E assim invalidastes o mandamento de Deus, por vossa própria tradição.
7. Hipócritas! Bem profetizou Isaías acerca de vós outros, dizendo:
8. Este povo com sua boca se achega a mim, e com seus lábios me honra; mas seu coração está longe de mim.
9. Mas em vão me honram, ensinando por doutrinas os mandamentos dos homens.
10. E chamando as multidões a si, disse-lhes: Ouvi vós, e entendei:
11. Não é o que na boca entra, aquilo que ao homem contamina; mas o que da boca sai, isso contamina ao homem.
12. Então chegando-se seus discípulos, disseram-lhe: Sabes que os fariseus, ouvindo esta palavra, se escandalizaram?
13. Mas respondendo ele, disse: Toda planta que meu Pai celestial não plantou, será desarraigada.
14. Deixai-os! Guias são, cegos, de cegos; e se o cego guiar ao cego, ambos cairão na cova.
15. E respondendo Pedro, disse-lhe: Declara-nos esta parábola.
16. E Jesus disse: Até vós outros estais ainda sem entendimento?
17. Não entendeis ainda que, tudo quanto entra na boca, vai ao ventre, e é lançado na privada?
18. Mas o que sai da boca, do próprio coração sai; e isto é o que ao homem contamina.
19. Porque do coração saem os maus pensamentos, mortes, adultérios, fornicações, furtos, falsos testemunhos, maledicências.
20. São estas as coisas que ao homem contaminam; mas comer sem lavar as mãos não contamina ao homem.
21. E saindo Jesus dali, foi-se para as partes de Tiro e de Sidom.
22. E eis que uma mulher cananéia, que tinha saído daqueles termos, clamava, dizendo-lhe: Senhor, filho de Davi! Tem misericórdia de mim, que minha filha está miseravelmente atormentada pelo demônio!
23. Mas ele não lhe respondeu palavra alguma. Chegando-se então seus discípulos, rogaram-lhe, dizendo: Despede-a, pois dá gritos após nós outros.
24. E respondendo ele, disse: Não sou enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel.
25. Então veio ela e adorou-o, dizendo: Senhor, acode-me!
26. E respondendo ele, disse: Não é bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos.
27. E ela disse: Assim é, Senhor; mas os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa de seus senhores.
28. Então respondeu Jesus, e disse: Ó mulher! Grande é a tua fé! Faça-se contigo como queres! E ficou sua filha sã desde aquela mesma hora.
29. E tendo Jesus partido dali, veio junto ao mar da Galileia; e subindo a um monte, assentou-se ali.
30. E chegaram-se a ele muitas multidões, que tinham consigo mancos, cegos, mudos, aleijados, e outros muitos enfermos; e lançaram-nos aos pés de Jesus, e ele os sarou.
31. De tal maneira que as multidões se maravilhavam vendo falarem os mudos, sãos os aleijados, andarem os mancos, e verem os cegos; e glorificavam ao Deus de Israel.
32. E chamando Jesus a seus discípulos, disse: Tenho compaixão do povo, pois já há três dias que perseveram comigo, e não têm o que comer; e mandá-los embora em jejum não quero, para que não desfaleçam no caminho.
33. Então seus discípulos lhe disseram: Donde temos nós tantos pães no deserto, para fartarmos tão grande povo?
34. E Jesus lhes disse: Quantos pães tendes? E eles disseram: Sete, e mais uns poucos peixinhos.
35. E mandou às multidões que se assentassem pelo chão.
36. E tomando os sete pães, e mais os peixes, e dando graças, partiu-os; e deu-os a seus discípulos, e os discípulos ao povo.
37. E comeram todos, e fartaram-se; e levantaram ainda sete cestos cheios dos pedaços que sobejaram.
38. E eram os que tinham comido quatro mil varões, afora as mulheres e os meninos.
39. Então sendo já despedidas as multidões, subiu num barco, e veio aos termos de Magdala.

Capítulo 16

1. E chegando-se os fariseus e os saduceus a ele, tentando-o, pediam-lhe que lhes mostrasse algum sinal do céu.
2. Mas respondendo ele, disse-lhes: Vindo a tarde do dia, dizeis: Bom tempo haverá; porque vermelho está o céu.
3. E pela manhã, dizeis: Hoje haverá tempestade; porque o céu se envermelhece triste. Hipócritas! Sabeis discernir a face do céu, mas os sinais dos tempos não podeis diferenciar?
4. A geração má e adulterina pede sinal, porém sinal não lhe será dado, senão o sinal de Jonas, o profeta. E deixando-os, foi-se.
5. E vindo seus discípulos para o outro lado, haviam-se esquecido de levar pão.
6. E Jesus lhes disse: Olhai, guardai-vos do fermento dos fariseus e saduceus.
7. E eles pensavam entre si, dizendo: Isso é porque não trouxemos conosco pão.
8. E entendendo-o Jesus, disse-lhes: Que pensais entre vós, ó apoucados na fé? Que não trouxestes convosco pão?
9. Não entendeis ainda, nem vos lembrais, dos cinco pães entre cinco mil homens, quantos cestos levantastes?
10. Nem dos sete pães entre quatro mil homens, e quantas alcofas erguestes?
11. Como não entendeis que não pelo pão eu vos disse que vos guardásseis do fermento dos fariseus e saduceus?
12. Então entenderam que não lhes dissera que se guardassem do fermento do pão, mas da doutrina dos fariseus e saduceus.
13. E vindo Jesus às partes de Cesaréia de Filipe, perguntou a seus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens que eu, o Filho do homem, sou?
14. E eles disseram: Uns, João Batista. E outros, Elias. E outros, Jeremias, ou algum dos profetas.
15. E ele lhes disse: E vós outros, quem dizeis que eu sou?
16. E respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivente.
17. Então, respondendo Jesus, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão, filho de Jonas. Porque nem a carne, nem o sangue, to revelou, senão meu Pai, que está nos céus.
18. Mas também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha igreja; e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.
19. E a ti te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o que atares na terra será atado nos céus e tudo que desatares na terra será desatado nos céus.
20. Então, tolheu a seus discípulos, que a ninguém dissessem que ele era Jesus, o Cristo.
21. Desde então, começou Jesus declarar a seus discípulos que lhe convinha ir a Jerusalém, e padecer muito dos anciãos, e dos príncipes dos sacerdotes, e dos escribas; e então ser morto, e ressurgir ao terceiro dia.
22. E tomando-o Pedro à parte, começou a repreendê-lo, dizendo: Senhor, tem compaixão de ti! Por nenhum modo te aconteça isto!
23. Então virando-se ele, disse a Pedro: Vai-te atrás de mim, Satanás, que estorvo me ésA tradução castelhana de base sugere “vai-te de diante de mim”, e não “vai-te para trás de mim”, embora esclareça em nota que o sentido do termo grego é mesmo “após mim” ou “atrás de mim”. Nesse caso, a versão portuguesa pode ter sido influenciada também pelas traduções holandesa, francesa ou italiana, pois todas buscam exprimir mais literalmente o sentido do advérbio grego ὀπίσω/opisó, isto é, “atrás”, “após” ou “depois”. Além disso, talvez em reverência para com a figura do apóstolo Pedro, em vez de “Satanás”, a tradução castelhana sugere “adversário”, tratando o termo grego Σατανᾶς/Satanas não como nome próprio, mas como substantivo comum – embora também indique em nota que o termo grego original corresponde a “Satanás”. A opção portuguesa por “Satanás” é coerente com todas as traduções de referência, como a holandesa, a francesa, a italiana, a latina, etc. Finalmente, o uso do termo “estorvo” encontra respaldo na própria Bíblia castelhana, visto que a maior parte das traduções consultadas sugerem a tradução do termo grego σκάνδαλον/skandalon como “escândalo” mesmo – opção esta que, por um lado, enfatiza a conexão natural entre os termos grego e português, mas por outro, dificulta o entendimento do termo grego como “obstáculo”, “impedimento” ou “estorvo”.! Porque não consideras as coisas que são de Deus, senão as que são dos homens!
24. Então disse Jesus a seus discípulos: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome sobre si sua cruz, e siga-me.
25. Porque qualquer que quiser salvar sua vida, perdê-la-á; e qualquer que, por causa de mim, perder sua vida, achá-la-á.
26. Porque que aproveita ao homem, se granjear todo o mundo, e perder sua alma? Ou que recompensa dará o homem por sua alma?
27. Porque o Filho do homem virá na glória de seu Pai, com seus anjos; e então renderá a cada um conforme a suas obras.
28. Em verdade vos digo que alguns há dos que aqui estão que não provarão a morte, até que não hajam visto ao Filho do homem, que vem em seu reino.

Capítulo 17

1. E seis dias depois, tomou Jesus a Pedro, e a Tiago, e a João, seu irmão, e levou-os à parte a um monte alto.
2. E transfigurou-se diante deles; e resplandeceu seu rosto como o sol, e suas vestes se fizeram brancas como a luz.
3. E eis que lhes apareceram Moisés e Elias, falando com ele.
4. E respondendo Pedro, disse a Jesus: Senhor, bom é que estamos nós aqui. Se queres, façamos aqui três cabanas: uma para ti, e outra para Moisés, e outra para Elias.
5. E estando ele ainda falando, eis que uma nuvem de luz os cobriu com sua sombra; e eis uma voz da nuvem que disse: Este é o meu amado Filho, em quem me agrado; a ele ouvi.
6. E ouvindo os discípulos isto, caíram sobre seus rostos, e temeram em grande maneira.
7. Então chegando Jesus, tocou-os, e disse: Levantai-vos, e não temais.
8. E levantando eles os olhos, não viram mais a ninguém, senão só a Jesus.
9. E assim que desceram do monte, mandou-lhes Jesus, dizendo: Não digais a visão a ninguém, até que o Filho do homem seja ressuscitado dos mortos.
10. Então lhe perguntaram seus discípulos, dizendo: Por que dizem, logo, os escribas que é necessário que Elias venha primeiro?
11. E respondendo Jesus, disse-lhes: Em verdade, Elias virá primeiro, e restaurará todas as coisas.
12. Mas digo-vos que já veio Elias, e não o reconheceram; antes, fizeram dele tudo quanto quiseram. Assim padecerá também por causa deles o Filho do homem.
13. Então entenderam os discípulos que lhes dizia isto a respeito de João Batista.
14. E como chegaram à multidão, veio um homem a ele, pondo-se de joelhos, e dizendo:
15. Senhor, tem misericórdia de meu filho, que é aluado, e padece muito mal; porque muitas vezes cai no fogo, e muitas outras vezes na água.
16. E apresentei-o a teus discípulos, mas não puderam curá-lo.
17. E respondendo Jesus, disse: Ó geração infiel e perversa! Até quando hei de estar convosco? Até quando vos hei de sofrer? Trazei-mo aqui.
18. E repreendeu-o Jesus, e saiu o demônio dele; e ficou o moço são desde aquela hora.
19. Chegando-se então os discípulos a Jesus, à parte, disseram: Por que não pudemos nós mesmos lançá-lo fora?
20. E Jesus lhes disse: Por vossa incredulidade. Porque em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte “passa-te daqui para acolá”, e passar-se-á; e nada vos será impossível.
21. Mas este gênero não sai senão por oração e jejum.
22. E convivendo eles na Galileia, disse-lhes Jesus: O Filho do homem será entregue nas mãos dos homens.
23. E matá-lo-ão, mas ao terceiro dia ressuscitará. E eles se entristeceram em grande maneira.
24. E chegando a Cafarnaum, vieram a Pedro os que cobravam as dracmas, e disseram: Não paga vosso mestre as dracmas?
25. E ele disse: Sim. E entrando em casa, Jesus se lhe antecipou, dizendo: Que te parece, Simão? De quem cobram os reis da terra os tributos, ou o censo? De seus filhos, ou dos alheios?
26. Pedro lhe disse: Dos alheios. Disse-lhe Jesus: Logo, livres estão os filhos.
27. Mas para que os não escandalizemos, vai ao mar, e lança o anzol; e o primeiro peixe que vier, toma-o; e abrindo-lhe a boca, acharás um estáter; toma-o, e dá-lho por mim e por ti.

Capítulo 18

1. Naquela mesma hora, chegaram-se os discípulos a Jesus, dizendo: Quem é, porém, o maior no reino dos céus?
2. E chamando Jesus a uma criança, pô-la no meio deles.
3. E disse: Em verdade vos digo que, se não vos converterdes, e não fordes como crianças, de maneira nenhuma entrareis no reino dos céus.
4. Assim que, qualquer que se rebaixar como esta criança, este é o maior no reino dos céus.
5. E qualquer que a uma tal criança receber em meu nome, a mim me recebe.
6. Mas qualquer que escandalizar a um destes pequenos que crêem em mim, melhor lhe seria que uma mó de atafonaA versão castelhana traz “una piedra de molino de asno”, sugerindo assim em português “uma pedra de moinho de asno”. Outras versões consultadas pelos tradutor, como a holandesa, a francesa e a italiana, trazem também a informação de que o termo grego original ὀνικός/onikos é adjetivo ligado ao animal “asno”, usado para qualificar o substantivo μύλος/mylos, isto é, “pedra de moinho”. Assim, a solução portuguesa, mais do que apenas reproduzir servilmente alguma das traduções consultadas, usa delas para expressar sinteticamente em nosso idioma o sentido original do texto grego; tendo em vista que “atafona”, palavra de origem árabe, diz respeito especificamente a um moinho movido geralmente por tração animal. se lhe pendurasse ao pescoço, e fosse subvertido no fundo do mar.
7. Ai do mundo por causa dos escândalos! Porque necessário é que venham escândalos; mas ai daquele homem por quem o escândalo vem!
8. Portanto, se tua mão ou teu pé te escandalizar, corta-os, e lança-os de ti: melhor te é entrar manco ou aleijado na vida, do que, tendo duas mãos ou dois pés, ser lançado no fogo eterno.
9. E se teu olho te escandalizar, tira-o, e lança-o de ti; que melhor te é entrar com um só olho na vida, do que, tendo dois olhos, ser lançado no fogo do inferno.
10. Olhai, não subestimeis a algum destes pequeninos; porque eu vos digo que seus anjos vêem sempre, nos céus, a face de meu Pai que está nos céus.
11. Porque vindo é o Filho do homem, para salvar o que se tinha perdido.
12. Que vos parece? Se um homem tivesse cem ovelhas, e se desgarrasse uma só dentre elas; não iria ele pelos montes, deixando as noventa e nove, em busca da que se tinha desgarrado?
13. E se acontecesse de achá-la, em verdade vos digo que mais se regozija por aquela, do que pelas noventa e nove que não se desgarraram.
14. Assim não é a vontade de vosso Pai, que está nos céus, que se perca nem um só destes pequeninos.
15. Portanto, se teu irmão pecar contra ti, vai e repreende-o, entre ti e ele só; se te ouvir, a teu irmão ganhaste.
16. Porém se não te ouvir, toma ainda contigo um ou dois, para que na boca de duas ou três testemunhas, consista toda palavra.
17. E se também não os ouvir a eles, dize-o à congregação; e se também não ouvir à congregação, tem-no por um gentio e publicano.
18. Em verdade vos digo que tudo o que atardes na terra será atado no céu; e tudo o que desatardes na terra será desatado no céu.
19. E digo-vos também que, se dois de vós outros entrarem em acordo na terra em qualquer coisa que pedirem, ser-lhes-á feito por meu Pai, que está nos céus.
20. Porque onde dois ou três estiverem congregados em meu nome, ali estou eu no meio deles.
21. Então Pedro, chegando-se a ele, disse: Senhor, quantas vezes perdoarei a meu irmão que pecar contra mim? Até sete?
22. Jesus lhe disse: Não te digo eu até sete, mas ainda até setenta vezes sete.
23. Pelo que semelhante é o reino dos céus a um certo rei, que quis fazer contas com seus servos.
24. E começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos.
25. Mas este, não podendo pagar, mandou o seu senhor vender a ele, e a sua mulher, e filhos, com tudo quanto tinha, e pagar a dívida.
26. Então aquele servo, prostrando-se, adorava-o, dizendo: Senhor, detém a ira para comigo, e tudo te pagarei.
27. E o senhor, movido de íntima compaixão por aquele servo, soltou-o, e perdoou-lhe a dívida.
28. E tendo saído aquele servo, achou um de seus companheiros, que lhe devia cem denários; e agarrando-o, sufocava-o, dizendo: Paga-me o que me deves!
29. Então seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Detém a ira para comigo, e tudo te pagarei.
30. Mas ele não quis; senão foi, e lançou-o na prisão, até que pagasse a dívida.
31. E vendo seus companheiros o que se passava, entristeceram-se muito; e vindo, declararam a seu senhor tudo o que se passara.
32. Então, chamando-o seu senhor, disse-lhe: Servo malvado, toda aquela dívida te perdoei, porque me rogaste.
33. Não te convinha a ti também ter misericórdia de teu companheiro, como também eu tive misericórdia de ti?
34. Então seu senhor, indignado, entregou-o aos executores, até que pagasse tudo o que lhe devia.
35. Assim fará também convosco meu Pai celestial, se de coração não perdoardes cada um a vossos irmãos as suas ofensas.

Capítulo 19

1. E aconteceu que, acabando Jesus estas palavras, passou-se da Galileia e veio aos termos da Judeia, havendo passado o Jordão.
2. E seguiram-no muitas multidões; e sarou-os ali.
3. Então chegaram-se a ele os fariseus, tentando-o, e dizendo-lhe: É lícito ao homem deixar por qualquer causa a sua mulher?
4. E respondendo ele, disse-lhes: Não tendes lido que, aquele que os fez no princípio, macho e fêmea os fez?
5. E disse: Portanto deixará o homem pai e mãe, e achegar-se-á à sua mulher, e serão dois em uma só carne.
6. Assim que já não são mais dois, senão uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou, não o separe o homem.
7. Disseram-lhe eles: Por que mandou então Moisés dar-lhe carta de desquite, e largá-la?
8. E ele lhes disse: Pela dureza dos vossos corações vos permitiu Moisés deixar vossas mulheres; mas ao princípio, não foi assim.
9. E eu vos digo que, qualquer que deixar sua mulher, salvo por causa de fornicação, e com uma outra se casar, adultera; e o que se casar com a deixada, também adultera.
10. Disseram-lhe seus discípulos: Se assim é a condição do homem para com a mulher, não convém casar-se.
11. Então ele lhes disse: Nem todos são capazes desta palavra, senão aqueles a quem é dado.
12. Porque há eunucos que nasceram assim, desde ventre de sua mãe; e há eunucos que pelos homens foram feitos tais; e há também eunucos que se fizeram eunucos por causa do reino dos céus: quem isto pode receber, receba-o.
13. Então foram-lhe apresentadas algumas crianças, para que pusesse as mãos sobre elas, e orasse; e os discípulos as repreenderam.
14. Mas Jesus disse: Deixai os pequeninos, e não os impeçais de vir a mim; porque dos tais é o reino dos céus.
15. E havendo posto sobre elas as mãos, partiu-se dali.
16. E eis que, chegando-se a ele um, disse-lhe: Ó bom mestre, que bem farei para alcançar a vida eterna?
17. E ele lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém há que seja bom, senão um só, isto é, Deus. E se queres mesmo entrar na vida, guarda os mandamentos.
18. Disse-lhe ele: Quais? E Jesus disse: Estes: Não matarás, não adulterarás, não furtarás, não dirás falso testemunho;
19. Honra a teu pai e a tua mãe, e também amarás a teu próximo como a ti mesmo.
20. Disse-lhe o rapaz: Tudo isto guardei desde minha mocidade; que mais me falta?
21. Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo quanto tens, e dá-o aos pobres; e terás um tesouro no céu. E vem, e segue-me.
22. E ouvindo o rapaz esta palavra, foi-se triste, porque tinha muitas posses.
23. Então disse Jesus a seus discípulos: Em verdade vos digo que dificilmente entrará o rico no reino dos céus.
24. E digo-vos mais, que mais fácil é passar um camelo pelo olho de uma agulha, do que entrar um rico no reino de Deus.
25. Ouvindo seus discípulos estas coisas, espantaram-se muito, dizendo: Quem poderá, logo, ser salvo?
26. E olhando Jesus para eles, disse-lhes: Quanto aos homens, impossível é isto; mas quanto a Deus, tudo é possível.
27. Então, respondendo Pedro, disse-lhe: Eis que nós temos deixado tudo, e te havemos seguido; que teremos, logo?
28. E Jesus lhes disse: Em verdade vos digo que vós, os que me tendes seguido, na regeneração, quando o Filho do homem se assentar no trono de sua glória, também vós outros vos assentareis sobre doze tronos, para julgar as doze tribos de Israel.
29. E qualquer que houver deixado casas, ou irmãos ou irmãs, ou pai ou mãe, ou mulher ou filhos, ou terras, por meu nome, cem vezes mais receberá; e por herança terá a vida eterna.
30. Porém muitos primeiros serão últimos; e muitos últimos, primeiros.

Capítulo 20

1. Porque semelhante é o reino dos céus a um homem, pai de família, que saiu de madrugada a contratar trabalhadores para sua vinha.
2. E combinando com os trabalhadores um denário ao dia, mandou-os à sua vinha.
3. E saindo perto das três horas, viu outros que estavam na praça, ociosos.
4. E disse-lhes: Ide vós outros também à minha vinha, e dar-vos-ei o que for justo. E foram.
5. E saiu outra vez, perto das seis, e também das nove horas; e fez o mesmo.
6. E saindo perto das onze horas, achou outros que estavam ociosos, e disse-lhes: Por que estais aqui todo o dia ociosos?
7. Disseram-lhe eles: Porque ninguém nos contratou. E ele lhes disse: Ide vós outros também à vinha, e recebereis o que for justo.
8. E vindo já o entardecer, disse o senhor da vinha a seu mordomo: Chama aos trabalhadores, e paga-lhes o salário, começando dos últimos, até os primeiros.
9. E vindo os que eram contratados de perto das onze horas, receberam, cada um, um denário.
10. E vindo também os primeiros, julgaram que haviam de receber mais; porém também eles receberam, cada um, um denário.
11. E tomando-o, murmuravam contra o pai de família,
12. Dizendo: Estes últimos trabalharam uma hora só, e igualaste-os conosco, que levamos a carga e a calma do diaA opção portuguesa por “calma”, em vez de simplesmente “calor” – como sugerem as traduções castelhana, francesa e holandesa de referência – parece ter sido tentativa consciente do tradutor de expressar mais fielmente o sentido do termo grego original καύσων/kausón, tendo em vista que ambos designam não apenas um “calor” genérico, mas um tipo específico de calor escaldante, intenso, desagradável, etc. Aliás, nesse caso, o texto português pode ter sido influenciado também pela tradução italiana de Giovanni Diodati, que emprega o termo “arsura”, e não “calore”. .
13. E respondendo ele, disse a um deles: Amigo, não te faço agravo; não combinaste tu comigo a um denário?
14. Toma o que é teu, e vai-te; eu quero dar a este último tanto como a ti.
15. Não me é a mim lícito fazer do meu o que quiser? Ou é o teu olho mau, porque eu sou bom?
16. Assim serão os últimos primeiros, e os primeiros, últimos; porque muitos são chamados, porém poucos escolhidos.
17. E subindo Jesus a Jerusalém, tomou seus doze discípulos à parte, no caminho, e disse-lhes:
18. Eis que subimos a Jerusalém, e o Filho do homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes, e aos escribas; e condená-lo-ão à morte.
19. E entregá-lo-ão às gentes para que dele escarneçam, e o açoitem e crucifiquem; mas ao terceiro dia, ressurgirá.
20. Então se chegou a ele a mãe dos filhos de Zebedeu, com seus filhos, adorando-o, e pedindo-lhe alguma coisa.
21. E ele lhe disse: Que queres? Disse-lhe ela: Dize que estes meus dois filhos se assentem, um à tua direita, e outro à tua esquerda, em teu reino.
22. Então respondendo Jesus, disse: Não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cálice que eu hei de beber? E ser batizados com o batismo com que eu sou batizado? Disseram-lhe eles: Podemos.
23. Disse-lhes ele: Em verdade que meu cálice bebereis, e com o batismo com que eu sou batizado, sereis batizados; mas o assentar-se à minha direita, e à minha esquerda, não é meu dá-lo; mas dar-se-á aos que por meu Pai está preparado.
24. E tão logo os dez ouviram isto, indignaram-se contra os dois irmãos.
25. Então chamando-os Jesus a si, disse: Bem sabeis que os príncipes das gentes têm domínio sobre elas; e os grandes usam sobre elas de autoridade.
26. Mas entre vós outros não será assim; mas o que entre vós outros quiser se fazer grande, será vosso servidor.
27. E o que entre vós outros quiser ser o primeiro, será vosso servo.
28. Assim como o Filho do homem não veio para ser servido, senão para servir, e dar sua vida em resgate por muitos.
29. Saindo eles então de Jericó, seguia-o grande multidão.
30. E eis que dois cegos, assentados junto ao caminho, ouvindo que Jesus passava, bradaram, dizendo: Senhor, filho de Davi, tem misericórdia de nós!
31. E o povo os repreendia, para que se calassem. Mas eles bradavam ainda mais, dizendo: Senhor, filho de Davi, tem misericórdia de nós!
32. E parando-se Jesus, chamou-os, e disse: Que quereis que eu vos faça?
33. Disseram-lhe eles: Senhor, que nossos olhos sejam abertos!
34. Então Jesus, tendo íntima compaixão deles, tocou-lhes os olhos; e logo seus olhos receberam a vista, e seguiram-no.

Capítulo 21

1. E assim que chegaram perto de Jerusalém, e vieram a Betfagê, ao Monte das Oliveiras, então mandou Jesus dois discípulos, dizendo-lhes:
2. Ide à aldeia que diante de vós está, e logo achareis uma asna atada, e um burrico com ela; desatai-a, e trazei-mos.
3. E se alguém vos disser alguma coisa, dizei: O Senhor precisa deles; e logo os enviará.
4. E tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta, que disse:
5. Dizei à filha de Sião: Eis que teu rei te vem a ti manso, assentado sobre uma asna, e um burrico, filho de animal de jugo.
6. E foram os discípulos, e fizeram como Jesus lhes mandou.
7. E trouxeram a asna, e também o burrico; e puseram sobre eles suas capas, e fizeram-no assentar sobre elas.
8. E grandíssima multidão estendia pelo caminho suas capas; e outros cortavam ramos das árvores, e os espalhavam pelo caminho.
9. E as multidões que iam diante, e as que iam detrás, bradavam, dizendo: Hosana ao Filho de Davi! Bendito o que vem em o nome do Senhor! Hosana nos altíssimos céusA expressão “altíssimos céus” parece ter sido aqui adotada por influência da Bíblia holandesa, que traz “hoogste hemelen”, traduzido em inglês por “highest heavens”. Isso porque a tradução castelhana de referência sugere o substantivo “alturas”, e não o adjetivo “altíssimos”. Tendo em conta que o termo grego original ὕψιστος/hupsistos é de fato adjetivo plural, a solução encontrada por diversas traduções é a inserção de um substantivo – seja “céus”, como no holandês e no português, seja “lugares”, como no francês (“lieux très-hauts”) ou no italiano (“luoghi altissimi”). Finalmente, a tradução do Novo Testamento em latim de Teodoro de Beza, certamente consultada pelo tradutor português, pode ter exercido também a sua influência, pois traz “coelis altissimis”, diferenciando-se da Vulgata, que traz apenas o adjetivo “altissimis”, mas sem lhe associar qualquer substantivo.!
10. E entrando em Jerusalém, toda a cidade se alvoroçou, dizendo: Quem é este?
11. E as multidões diziam: Este é Jesus, o profeta de Nazaré, da Galileia.
12. E entrou Jesus no templo de Deus, e lançou fora todos os que vendiam e compravam no templo; e transtornou as mesas dos cambistas, e as cadeiras dos que vendiam pombas.
13. E disse-lhes: Escrito está: Minha casa, casa de oração será chamada. Mas vós outros a tendes feito covil de salteadores.
14. Então vieram a ele cegos e coxos, no templo, e sarou-os.
15. Mas os príncipes dos sacerdotes e os escribas, vendo as maravilhas que ele fazia – e as crianças bradando no templo, e dizendo: Hosana ao Filho de Davi! –, indignaram-se;
16. E disseram-lhe: Não ouves o que estes dizem? Mas Jesus lhes disse: Sim; nunca lestes: Da boca das crianças, e dos que ainda mamam, aperfeiçoaste para ti o louvor?
17. E deixando-os, saiu-se fora da cidade, para Betânia, e pousou ali.
18. E pela manhã, tornando à cidade, teve fome.
19. E vendo uma figueira perto do caminho, veio a ela, e não achou nela nada, senão folhas somente; e disse-lhe: Nunca mais nasça de ti fruto, para sempre. E logo a figueira se secou.
20. Então os discípulos, vendo isto, maravilhados, diziam: Como se secou logo a figueira?
21. E respondendo Jesus, disse-lhes: Em verdade vos digo que, se tiverdes fé, e não duvidardes, não só fareis o que à figueira aconteceu; mas até se a este monte disserdes “ergue-te, e lança-te no mar”, será feito.
22. E tudo o que pedirdes com oração, crendo, o recebereis.
23. E como veio ao templo, e estivesse já ensinando, chegaram a ele os príncipes dos sacerdotes, e os anciãos do povo, dizendo: Com que autoridade fazes isto? E quem te deu esta autoridade?
24. E respondendo Jesus, disse-lhes: Também eu vos perguntarei uma palavra; a qual, se me disserdes, também eu vos direi com que autoridade faço isto:
25. O batismo de João, de onde era? Do céu, ou dos homens? Eles então pensaram entre si, dizendo: Se dissermos “do céu”, dir-nos-á: Por que então lhe não destes crédito?
26. Mas se dissermos “dos homens”, tememos ao povo, porque todos têm a João por profeta.
27. E respondendo a Jesus, disseram: Não sabemos. E ele também lhes disse: Nem eu vos direi com que autoridade faço isto.
28. Mas que vos parece? Um homem tinha dois filhos. E chegando ao primeiro, disse-lhe: Filho, vai hoje trabalhar em minha vinha.
29. E respondendo ele, disse: Não quero. Mas depois, arrependido, foi.
30. E chegando ao outro, disse-lhe da mesma maneira. E respondendo ele, disse: Eu, senhor, vou. Mas não foi.
31. Qual dos dois fez a vontade do pai? Disseram eles: O primeiro. Disse-lhes Jesus: Em verdade vos digo que os publicanos e as rameiras se vão adiante de vós ao reino dos céus.
32. Porque veio a vós outros João, pela via da justiça, e não lhe destes crédito; e os publicanos e as rameiras lhe deram. E vós outros, vendo isto, nunca vos arrependestes para lho dar.
33. Ouvi vós outra parábola: Houve um homem, pai de família, o qual plantou uma vinha. E cercou-a com valado, e fundou nela um lagar, e edificou uma torre; e arrendou-a a uns lavradores, e partiu-se para longe.
34. E chegando-se o tempo dos frutos, mandou seus servos aos lavradores, para que recebessem seus frutos.
35. Mas os lavradores, tomando aos servos, a um feriram, e a outro mataram, e ao terceiro apedrejaram.
36. Outra vez, mandou a outros servos, mais que os primeiros; e procederam com eles da mesma maneira.
37. E por fim, mandou-lhes a seu filho, dizendo: Terão respeito a meu filho.
38. Mas os lavradores, vendo ao filho, disseram entre si: Este é o herdeiro! Vinde, matemo-lo, e tomemos sua herdade.
39. E tomando-o, lançaram-no fora da vinha, e mataram-no.
40. Pois quando vier o senhor da vinha, que fará àqueles lavradores?
41. Disseram-lhe eles: Aos maus destruirá desastrosamente, e sua vinha arrendará a outros lavradores, que lhe paguem o fruto a seus tempos.
42. Disse-lhes Jesus: Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os que edificavam rejeitaram, esta foi feita por cabeça de esquina? Pelo Senhor foi feito isto, e é coisa maravilhosa aos nossos olhos.
43. Portanto vos digo que o reino de Deus se vos tirará de vós outros, e se dará a gente que dele renda o devido fruto.
44. E o que cair sobre esta pedra, será quebrantado; e sobre quem ela cair, será despedaçado.
45. E ouvindo os príncipes dos sacerdotes e os fariseus estas suas parábolas, entenderam que falava deles.
46. E procurando prendê-lo, temeram as multidões; porque o tinham por profeta.

Capítulo 22

1. E respondendo Jesus, tornou-lhes a falar por parábolas, dizendo:
2. Semelhante é o reino dos céus a um homem  que, sendo rei, fez bodas a seu filho.
3. E mandou a seus servos que chamassem aos convidados às bodas; porém não quiseram vir.
4. Tornou a mandar outros servos, dizendo: Dizei aos convidados: Eis que meu jantar tenho preparado, meus bezerros e cevados já estão mortos, e tudo está já pronto! Vinde às bodas!
5. Porém eles não fizeram caso; e foram-se, um à sua lavoura, e outro a seus negócios.
6. E outros, tomando a seus servos, afrontaram-nos, e mataram-nos.
7. E o rei, ouvindo isto, indignou-se; e mandando seus exércitos, destruiu àqueles homicidas, e pôs fogo à sua cidade.
8. Então disse a seus servos: Em verdade, preparadas estão as bodas; porém não eram delas dignos os convidados.
9. Ide, pois, às saídas dos caminhos, e chamai às bodas a tantos quantos achardes.
10. E saindo seus servos pelos caminhos, ajuntaram a todos quantos acharam, tanto maus como bons; e as bodas se encheram de convidados.
11. E entrou o rei para ver os convidados; e viu ali um homem que não estava vestido com vestes de bodas.
12. E disse-lhe: Amigo, como entraste aqui, não tendo veste de bodas? E tapou-se-lhe a boca.
13. Então o rei disse aos que serviam: Tomai-o e, amarrado de pés e de mãos, lançai-o nas trevas do lado de fora. Ali estará o choro, e o bater de dentes.
14. Porque muitos são chamados, porém poucos escolhidos.
15. Então, indo-se os fariseus, consultaram para ver como o apanhariam em alguma palavra.
16. E enviaram-lhe seus discípulos, junto com os herodianos, dizendo: Mestre, bem sabemos que és verdadeiro, e que com verdade ensinas o caminho de Deus; e que de ninguém fazes caso, porque não atentas para a aparência de homens.
17. Dize-nos, pois: Que te parece? É lícito dar tributo a César, ou não?
18. Mas Jesus, entendendo a malícia deles, disse-lhes: Por que me tentais, ó hipócritas?
19. Mostrai-me a moeda do tributo. E eles lhe mostraram um denário.
20. Então disse-lhes: De quem é esta figura, e a inscrição?
21. Disseram-lhe eles: De César. E ele lhes disse: Pagai, pois, a César o que é de César; e a Deus, o que é de Deus.
22. E ouvindo eles isto, maravilharam-se; e deixaram-no, e foram-se.
23. Naquele mesmo dia, chegaram a ele os saduceus, que dizem não haver ressurreição. E perguntaram-lhe,
24. Dizendo: Mestre, Moisés disse: Se algum homem morrer sem filhos, case-se seu irmão com sua mulher; e suscitará semente ao seu irmão.
25. Houve, pois, entre nós outros sete irmãos. E o primeiro tomando mulher, morreu; e não tendo geração, deixou sua mulher a seu irmão.
26. Da mesma maneira também o segundo, e o terceiro, até os sete.
27. E depois de todos, morreu também a mulher.
28. Na ressurreição, pois, de qual dos sete será ela a mulher? Porque todos a tiveram.
29. Então respondendo Jesus, disse-lhes: Errais, ignorando as Escrituras, e a potência de Deus.
30. Porque na ressurreição, nem se casam nem se dão em casamento; mas são como os anjos de Deus no céu.
31. E a respeito da ressurreição dos mortos, não tendes lido o que por Deus vos foi dito, quando ele diz:
32. Eu sou o Deus de Abraão, e o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó? Deus não é Deus dos mortos, mas dos que vivem.
33. E ouvindo isto as multidões, maravilhavam-se de sua doutrina.
34. Então os fariseus, ouvindo que havia tapado a boca aos saduceus, ajuntaram-se concordemente.
35. E perguntou um deles, intérprete da Lei, tentando-o, e dizendo:
36. Mestre, qual é o grande mandamento na Lei?
37. E Jesus lhe disse: Amarás ao Senhor, teu Deus, de todo teu coração, e de toda tua alma, e de todo teu entendimento.
38. Este é o primeiro, e o grande mandamento.
39. E o segundo, semelhante a este: Amarás a teu próximo, como a ti mesmo.
40. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os profetas.
41. E estando juntos os fariseus, Jesus lhes perguntou,
42. Dizendo: Que vos parece acerca do Cristo? De quem é filho? Disseram-lhe eles: Filho de Davi.
43. Ele lhes disse: Pois como Davi, em Espírito, o chama seu Senhor, dizendo:
44. Disse o Senhor a meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha a teus inimigos por escabelo de teus pés?
45. Pois se Davi o chama seu Senhor, como é ele seu filho?
46. E ninguém lhe podia responder palavra alguma, nem ousou ninguém mais, desde aquele dia, a lhe perguntar nada.

Capítulo 23

1. Então Jesus falou às multidões, e a seus discípulos,
2. Dizendo: Sobre a cadeira de Moisés se assentam os escribas e os fariseus.
3. Assim que, tudo quanto vos disserem que guardeis, guardai-o, e fazei-o. Mas não façais conforme a suas obras; porque dizem, e não fazem.
4. Porque atam cargas pesadas, e difíceis de levar, e põem-nas sobre os ombros dos homens; porém eles nem mesmo com seu dedo as querem mover.
5. Antes, todas suas obras fazem para serem vistos dos homens; porque alargam suas filactérias, e estendem as bordas de suas vestes.
6. E amam os primeiros assentos nas ceias, e as primeiras cadeiras nas sinagogas;
7. E as saudações nas praças, e serem chamados pelos homens “Rabi, Rabi”.
8. Mas vós outros não sereis chamados “rabis”, porque um só é vosso mestre: o Cristo; e todos vós outros sois irmãos.
9. E não chameis a ninguém na terra “vosso pai”, porque um só é vosso Pai, o qual está nos céus.
10. Nem sereis chamados mestres, porque um é vosso mestre: o Cristo.
11. Porém o maior entre vós outros, seja o vosso servidor.
12. Porque o que se exaltar, será humilhado; e o que se humilhar, será exaltado.
13. Mas ai de vós outros, escribas e fariseus, hipócritas! Porque fechais o reino dos céus aos homens; e nem vós outros entrais, nem aos que entram deixais entrar.
14. Ai de vós outros, escribas e fariseus, hipócritas! Porque engolis as casas das viúvas, colorindo-o com larga oraçãoA expressão “colorindo-o com larga oração” – ou “com cor de larga oração” – advém do próprio embasamento da tradução portuguesa sobre a versão castelhana de Casiodoro de Reina, que traz “con color de luenga oración”. Trata-se aqui de uma possibilidade interessante de tradução do substantivo grego original πρόφασις/prophasis, que tem por significado “pretexto” ou “desculpa”, mas cuja etimologia deriva do verbo φαίνω/phainó, isto é, “aparecer”, “reluzir”, “revelar-se”. Assim, a tradução portuguesa, certamente seguindo a castelhana, adota aqui o termo “cor” ou “colorir”, mas com esse sentido de figurado de “disfarce”, “aparência, “pretexto”, “fingimento”, etc.; por isso levareis mais grave juízo.
15. Ai de vós outros, escribas e fariseus, hipócritas! Porque rodeais o mar e a terra para fazerdes um convertido; e quando já está feito, fazei dele um filho do inferno duas vezes mais que vós outros.
16. Ai de vós outros, guias cegos, que dizeis: Qualquer que jurar pelo templo, não é nada; mas qualquer que jurar pelo ouro do templo, torna-se devedor.
17. Loucos e cegos! Qual é maior: o ouro, ou o templo que santifica ao ouro?
18. E também: Qualquer que jurar pelo altar, não é nada; mas qualquer que jurar pela dádiva que está sobre ele, torna-se devedor.
19. Loucos e cegos! Qual é maior: a dádiva, ou o altar que santifica à dádiva?
20. Portanto, aquele que jurar pelo altar, jura por ele, e por tudo quanto sobre ele está.
21. E o que jurar pelo templo, jura por ele, e por aquele que nele habita.
22. E o que jurar pelo céu, jura pelo trono de Deus, e pelo que sobre ele está assentado.
23. Ai de vós outros, escribas e fariseus, hipócritas! Porque dizimais a hortelã, e o endro, e o cominho, e deixais de lado o que é o mais grave da Lei: o juízo, e a misericórdia, e a fé. Isto era necessário fazer, e não deixar o outro.
24. Guias cegos, que coais o mosquito, e engolis o camelo!
25. Ai de vós outros, escribas e fariseus, hipócritas! Porque limpais o que está do lado de fora do copo ou do prato, mas por dentro está tudo cheio de roubo e de destemperança.
26. Fariseu cego! Limpa primeiro o que está por dentro do copo ou do prato, para que também o que está do lado de fora fique limpo.
27. Ai de vós outros, escribas e fariseus, hipócritas! Porque sois semelhantes aos sepulcros caiados; os quais por fora, em verdade, se mostram formosos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos, e de toda imundícia.
28. Assim também vós outros, por fora, em verdade vos mostrais justos aos homens; porém por dentro estais cheios de hipocrisia e maldade.
29. Ai de vós outros, escribas e fariseus, hipócritas! Porque edificais os sepulcros dos profetas, e adornais os monumentos dos justos.
30. E dizeis: Se fôssemos nós nos dias de nossos pais, nunca teríamos sido seus companheiros no sangue dos profetas.
31. Assim que por vós mesmos dais testemunho de que sois filhos daqueles que mataram aos profetas.
32. Enchei vós também a medida de vossos pais!
33. Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da condenação do inferno?
34. Portanto, eis que vos mando profetas, e sábios, e escribas. E deles a uns matareis, e crucificareis; e a outros açoitareis em vossas sinagogas, e perseguireis de cidade em cidade.
35. Para que venha sobre vós outros todo o sangue justo que foi derramado sobre a terra: desde o sangue de Abel, o justo, até o sangue de Zacarias, filho de Baraquias, ao qual matastes entre o templo e o altar.
36. Em verdade vos digo que tudo isto virá sobre esta geração.
37. Jerusalém, Jerusalém! Que matas aos profetas, e apedrejas aos que te são enviados! Quantas vezes quis eu ajuntar teus filhos, como a galinha ajunta a seus pintainhos debaixo de suas asas, e vós não quisestes!
38. Eis que a vossa casa se vos deixa deserta.
39. Porque eu vos digo que, desde agora, não mais me vereis, até que digais: Bendito aquele que vem em o nome do Senhor!

Capítulo 24

1. E saindo Jesus do templo, foi-se; e chegaram-se a ele seus discípulos, para lhe mostrarem os edifícios do templo.
2. E respondendo Jesus, disse-lhes: Vedes tudo isto? Pois em verdade vos digo que não será deixada aqui pedra sobre pedra, que não seja destruída.
3. E assentando-se no Monte das Oliveiras, chegaram-se a ele seus discípulos, à parte, dizendo: Dize-nos quando serão estas coisas, e que sinal haverá de tua vinda, e do fim do mundo.
4. E respondendo Jesus, disse-lhes: Olhai que ninguém vos engane.
5. Porque virão muitos em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo; e a muitos enganarão.
6. E ouvireis de guerras, e de rumores de guerras. Olhai que não vos perturbeis, porque é necessário que tudo isto aconteça; mas ainda não é o fim.
7. Porque se levantará nação contra nação, e reino contra reino; e haverá pestilências, e fomes, e terremotos em diversos lugares.
8. Mas todas estas coisas são só princípios de angústias.
9. Então vos entregarão para serdes afligidos, e matar-vos-ão; e sereis odiados de todas as nações, por causa do meu nome.
10. E muitos então serão escandalizados; e entregar-se-ão uns aos outros, e uns aos outros se odiarão.
11. E muitos falsos profetas se levantarão, e a muitos enganarão.
12. E por se haver multiplicado a maldade, o amor de muitos se esfriará.
13. Mas o que perseverar até o fim, esse será salvo.
14. E pregar-se-á este evangelho do reino em todo o mundo, em testemunho a todas as nações; e então virá o fim.
15. Portanto, quando virdes a abominação da assolação, que foi predita por Daniel, o profeta, estabelecida no lugar santo (quem lê, entenda),
16. Então os que estiverem na Judeia, fujam para os montes.
17. E o que estiver sobre o telhado, não desça a tomar alguma coisa de sua casa.
18. E o que estiver no campo, não torne atrás a tomar suas vestes.
19. Mas ai das grávidas, e das que naqueles dias amamentam!
20. Orai, pois, para que vossa fuga não seja no inverno, nem no dia de sábado.
21. Porque haverá então grande aflição, qual nunca houve, desde o princípio do mundo até agora, nem tampouco haverá.
22. E se aqueles dias não fossem abreviados, nenhuma carne se salvaria. Mas por causa dos escolhidos, serão abreviados aqueles dias.
23. Então se alguém vos disser “eis aqui o Cristo”, ou “eis ali”, não o creiais.
24. Porque se levantarão falsos cristos, e falsos profetas; e tão grandes sinais e prodígios farão que, se possível fora, até aos escolhidos enganariam.
25. Eis que vo-lo tenho dito antes.
26. Assim que, se vos disserem “ei-lo aqui no deserto”, não saiais; ou “ei-lo aqui nas câmaras”, não o creiais.
27. Porque como o relâmpago que sai do oriente e se mostra até o ocidente, assim será também a vinda do Filho do homem.
28. Porque onde quer que estiver o cadáver, ali se ajuntarão também as águias.
29. E logo depois da aflição daqueles dias, o Sol se escurecerá, e a Lua não dará sua luz, e as estrelas cairão do céu; e as virtudes dos céus se comoverão.
30. Então se mostrará o sinal do Filho do homem no céu. E então se lamentarão todas as tribos da terra; e verão o Filho do homem, que virá sobre as nuvens do céu, com grande poder e glória.
31. E mandará a seus anjos, com grande voz de trombeta; e ajuntarão a seus escolhidos desde os quatro ventos, e desde uma extremidade dos céus até a outra.
32. Da figueira aprendei a comparação: quando já seus ramos se enverdecem, e as folhas brotam, sabeis que o verão está perto.
33. Assim também vós outros, quando virdes todas estas coisas, sabei que já está bem perto, às portas.
34. Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas estas coisas aconteçam.
35. O céu e a terra perecerão, mas minhas palavras não perecerão.
36. Porém o dia e a hora, ninguém o sabe, nem mesmo os anjos do céu; senão só meu Pai.
37. Mas como foram os dias de Noé, assim será também a vinda do Filho do homem.
38. Porque como nos dias do dilúvio andavam comendo e bebendo, casando-se e dando em casamento, até o dia em que Noé na arca entrou.
39. E não perceberam, até que veio o dilúvio, e os levou a todos; assim será também a vinda do Filho do homem.
40. Então estarão dois no campo: um será tomado, e outro será deixado.
41. Duas mulheres estarão moendo junto a um moinho: uma será tomada, e outra será deixada.
42. Vigiai, pois; porque não sabeis a que hora há de vir o vosso Senhor.
43. Isto, porém, sabei: que se o pai de família soubesse a que vela da noite o ladrão havia de vir, vigiaria, e não deixaria minar sua casa.
44. Portanto também vós outros estai apercebidos; porque o Filho do homem há de vir à hora em que não pensais.
45. Quem, pois, é o servo fiel e prudente, ao qual o senhor pôs sobre seus servidores, para que lhes dê o sustento a seu tempo?
46. Bem-aventurado aquele servo ao qual, quando seu senhor vier, o achar fazendo assim.
47. Em verdade vos digo que sobre todos seus bens o estabelecerá.
48. E se aquele servo mau disser em seu coração: Meu senhor tarda em vir;
49. E começar a espancar a seus companheiros, e também a comer e a beber com os bêbados;
50. Virá o senhor daquele servo no dia em que ele não espera, e à hora em que ele não sabe.
51. E separá-lo-á, e porá sua parte com os hipócritas: ali estará o choro, e o bater de dentes.

Capítulo 25

1. Então o reino dos céus será semelhante a dez virgens que, tomando suas lâmpadas, saíram a receber o esposo.
2. E cinco delas eram prudentes; mas as outras cinco, parvas.
3. As que eram parvas, tomando suas lâmpadas, não tomaram azeite consigo.
4. Mas as prudentes tomaram azeite em seus vasos, juntamente com suas lâmpadas.
5. E tardando o esposo, toscanejaram todas, e adormeceram.
6. E à meia-noite ouviu-se um brado, que dizia: Eis que vem o esposo! Saí para recebê-lo!
7. Então todas aquelas virgens se levantaram, e prepararam suas lâmpadas.
8. E as parvas disseram às prudentes: Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas lâmpadas se vão apagando.
9. Mas as prudentes responderam, dizendo: De nenhuma maneira! Para que não nos falte a nós, nem a vós; ide antes aos que vendem, e comprai para vós outras!
10. E tendo elas ido para comprar, veio o esposo; e as que estavam preparadas entraram com ele às bodas. E fechou-se a porta.
11. E depois vieram também as outras virgens, dizendo: Senhor, senhor! Abre-nos!
12. Mas respondendo ele, disse: Em verdade vos digo que não vos conheço.
13. Vigiai, pois; porque não sabeis o dia, nem a hora, em que o Filho do homem há de vir.
14. Porque é como um homem que, partindo-se para longe, chamou a seus servos, e entregou-lhes seus bens.
15. E a um deu cinco talentos; e a outro, dois; e a outro, um; a cada um conforme a sua capacidade. E partiu-se logo, para longe.
16. E tendo ele partido, o que tinha recebido cinco talentos negociou com eles, e granjeou outros cinco talentos.
17. Semelhantemente também o que tinha recebido dois, granjeou também outros dois.
18. Mas o que tinha recebido um foi, e enterrou-o no chão; e escondeu o dinheiro de seu senhor.
19. E depois de muito tempo, veio o senhor daqueles servos, e fez contas com eles.
20. E chegando o que tinha recebido cinco talentos, trouxe outros cinco talentos, dizendo: Senhor, cinco talentos me entregaste; eis que outros cinco talentos tenho granjeado com eles.
21. E seu senhor lhe disse: Bem está, bom servo e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre o muito te porei. Entra no regozijo do teu senhor!
22. E chegando também o que tinha recebido dois talentos, disse: Senhor, dois talentos me entregaste; eis que outros dois talentos granjeei com eles.
23. Seu senhor lhe disse: Bem está, bom servo e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre o muito te porei. Entra no regozijo do teu senhor!
24. E chegando também o que tinha recebido um talento, disse: Senhor, eu te conhecia; que és homem duro, que segas onde não semeaste, e colhes onde não espalhaste.
25. Portanto, tive medo, e fui, e escondi teu talento na terra; eis que aqui tens o que é teu.
26. E respondendo seu senhor, disse-lhe: Servo maligno e negligente! Sabias que sego onde não semeei, e colho onde não espalhei.
27. Portanto, te convinha a ti dar meu dinheiro aos cambistas; e vindo eu, receberia o que é meu com juros.
28. Tirai-lhe, pois, o talento; e dai-o ao que tem dez talentos.
29. Porque a qualquer que tiver, ser-lhe-á dado, e terá abundantemente; e ao que não tiver, até o que tem lhe será tirado.
30. E ao servo inútil, lançai-o nas trevas, do lado de fora; ali estará o choro, e o bater de dentes.
31. E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com ele; então se assentará sobre o trono de sua glória.
32. E ajuntar-se-ão diante dele todas as gentes; e apartá-los-á a uns dos outros, como aparta o pastor as ovelhas dos bodes.
33. E porá as ovelhas à sua direita, e os bodes à esquerda.
34. Então dirá o rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, ó benditos de meu Pai! Possuí vós por herança o reino que, desde a fundação do mundo, vos está preparado.
35. Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; fui forasteiro, e acolhestes-me.
36. Nu, e cobristes-me; enfermo, e visitastes-me; estive na prisão, e viestes a mim.
37. Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos faminto, e te sustentamos? Ou sedento, e te demos de beber?
38. E quando te vimos forasteiro, e te acolhemos? Ou nu, e te cobrimos?
39. Ou quando te vimos enfermo, ou na prisão, e viemos a ti?
40. E respondendo o rei, dir-lhes-á: Em verdade vos digo que tudo quanto fizestes a um destes mais pequeninos de meus irmãos, a mim o fizestes.
41. Então dirá também aos que estiverem à esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, ao fogo eterno, que para o diabo e para seus anjos está preparado!
42. Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber.
43. Fui forasteiro, e não me acolhestes; nu, e não me cobristes; enfermo, e na prisão estive, e não me visitastes.
44. Então também eles lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos faminto, ou sedento, ou forasteiro, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não te servimos?
45. Então lhes responderá, dizendo: Em verdade vos digo que tudo quanto não fizestes a um destes mais pequeninos, também a mim não o fizestes.
46. E irão estes ao tormento eterno; e os justos, à vida eterna.

Capítulo 26

1. E aconteceu que, tendo Jesus acabado todas estas palavras, disse a seus discípulos:
2. Bem sabeis que daqui a dois dias é a Páscoa; e o Filho do homem será entregue para ser crucificado.
3. Então os príncipes dos sacerdotes, e os escribas, e os anciãos do povo, se ajuntaram na sala do sumo pontífice, o qual se chamava Caifás.
4. E juntos deliberaram que, por meio de engano, haviam de prender a Jesus, e matá-lo.
5. E diziam: Não já, no dia da festa, para que não se faça alvoroço entre o povo.
6. E estando Jesus em Betânia, na casa de Simão, o leproso;
7. Veio a ele uma mulher, com um vaso de alabastro de unguento de alto preço; e derramou-lho sobre a cabeça, estando ele assentado à mesa.
8. O que, vendo seus discípulos, indignaram-se, dizendo: De que serve tal desperdício?
9. Porque este unguento se podia vender por alto preço, e dar-se aos pobres!
10. E entendendo-o Jesus, disse-lhes: Por que importunais a esta mulher, que me fez uma boa obra?
11. Porque aos pobres, sempre convosco os tereis; porém a mim, não me tereis sempre.
12. Porque derramando ela este unguento sobre o meu corpo, como preparação de minha sepultura o fez.
13. Em verdade vos digo que, onde quer que este evangelho, em todo o mundo, for pregado; ali também o que esta fez será dito, para sua memória.
14. Então um dos doze, que se chamava Judas Iscariotes, foi-se aos príncipes dos sacerdotes.
15. E disse-lhes: Que me quereis dar? E eu vo-lo entregarei. E eles lhe assinalaram trinta moedas de prata.
16. E desde então, buscava uma oportunidade para o entregar.
17. E no primeiro dia da festa dos pães ázimos, vieram os discípulos a Jesus, dizendo-lhe: Onde queres que te preparamos para comer a Páscoa?
18. E ele disse: Ide à cidade, a um tal, e dizei-lhe: O Mestre diz: Meu tempo está perto; em tua casa farei a Páscoa com os meus discípulos.
19. E os discípulos fizeram tal como Jesus lhes mandara, e prepararam a Páscoa.
20. E vindo já o entardecer, assentou-se à mesa com os doze.
21. E comendo eles, disse: Em verdade vos digo que um dentre vós outros me há de entregar.
22. E entristecendo-se eles em grande maneira, começou cada um deles a dizer: Porventura sou eu, Senhor?
23. Então ele, respondendo, disse: O que comigo mete a mão no prato, esse mesmo me há de entregar.
24. Em verdade, o Filho do homem vai como acerca dele está escrito. Mas ai daquele homem por quem o Filho do homem é entregue; bom seria ao tal homem não haver nascido.
25. Então respondendo Judas, o que o entregava, disse: Porventura sou eu, Mestre? Ele lhe disse: Tu o disseste.
26. E comendo eles, tomou Jesus o pão e, havendo dado graças, partiu-o, e deu-o a seus discípulos. E disse: Tomai, comei; isto é o meu corpo.
27. E tomando o cálice, e dando graças, deu-lho, dizendo: Bebei dele vós todos.
28. Porque isto é o meu sangue, o sangue do novo testamento; o qual por muitos se derrama, para remissão dos pecados.
29. E digo-vos que, desde agora, não beberei mais deste fruto de vide; até aquele dia quando convosco o beber novo, no reino de meu Pai.
30. E havendo cantado o hino, saíram-se rumo ao Monte das Oliveiras.
31. Então Jesus lhes disse: Todos vós outros vos escandalizareis em mim esta noite. Porque escrito está: Ferirei ao pastor, e as ovelhas do rebanho se desgarrarão.
32. Mas depois de eu haver ressuscitado, irei diante de vós outros à Galileia.
33. E respondendo Pedro, disse-lhe: Ainda que todos em ti se escandalizem, eu nunca me escandalizarei.
34. Disse-lhe Jesus: Em verdade te digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, tu me negarás três vezes.
35. Disse-lhe Pedro: Ainda que contigo morrer me seja necessário, não te negarei. E todos os discípulos disseram o mesmo.
36. Então chegou Jesus com eles a uma aldeia que se chama Getsêmani. E disse a seus discípulos: Assentai-vos aqui, até que eu ali vá, e ore.
37. E tomando consigo a Pedro, e aos dois filhos de Zebedeu, começou a se entristecer e a se angustiar, em grande maneira.
38. Então Jesus lhes disse: Minha alma está mui triste, até a morte. Ficai-vos aqui, e vigiai comigo.
39. E indo-se um pouco mais adiante, prostrou-se sobre o seu rosto, orando, e dizendo: Pai meu, se é possível, passe de mim este cálice; porém não como eu quero, mas como tu queres.
40. E veio a seus discípulos, e achou-os dormindo. E disse a Pedro: Basta que nem ainda uma hora comigo pudestes vigiar?
41. Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, em verdade, está pronto, mas a carne é fraca.
42. E tornou uma segunda vez, e orou, dizendo: Pai meu, se não pode este cálice passar de mim, sem que eu o beba, faça-se a tua vontade!
43. E veio junto deles, e achou-os outra vez dormindo; porque seus olhos estavam pesados.
44. E deixando-os, tornou; e orou uma terceira vez, dizendo as mesmas palavras.
45. Então veio a seus discípulos, e disse-lhes: Dormi vós já, e descansai. Eis que chegada é a hora, e o Filho do homem está entregue nas mãos dos pecadores.
46. Levantai-vos, vamo-nos; eis que chegado é o que a mim me trai.
47. E estando ele ainda falando, eis que chegou Judas, um dos doze; e com ele uma grande companhia com espadas e bastões, da parte dos príncipes dos sacerdotes, e dos anciãos do povo.
48. E o que o traía lhes tinha dado um sinal, dizendo: Àquele que eu beijar, esse é; prendei-o.
49. E logo chegando junto a Jesus, disse: Salve, mestre! E o beijou.
50. E Jesus lhe disse: Amigo, a que vens? Então chegaram, e deitaram as mãos em Jesus, e prenderam-no.
51. E eis que um dos que estavam com Jesus, estendendo a mão, puxou de sua espada; e ferindo ao servo do sumo pontífice, cortou-lhe uma orelha.
52. Então Jesus lhe disse: Torna tua espada ao seu lugar; porque todos os que espada tomarem, à espada morrerão.
53. Ou pensas tu que não possa eu agora mesmo orar a meu Pai, e ele me daria mais de doze legiões de anjos?
54. Como, pois, se cumpririam as Escrituras, que dizem que assim convém que se faça?
55. Naquela hora, disse Jesus às multidões: Como a um ladrão saístes, com espadas e bastões, a me prender? A cada dia me assentava convosco, ensinando no templo, e não me prendestes.
56. Mas tudo isto se faz, para que as Escrituras dos profetas se cumpram. Então todos os discípulos fugiram, deixando-o a ele.
57. E os que prenderam a Jesus, trouxeram-no a Caifás, sumo pontífice, onde os escribas e os anciãos estavam juntos.
58. Mas Pedro o seguia de longe, até a sala do sumo pontífice; e tendo entrado, assentou-se com os criados, até ver o fim.
59. E os príncipes dos sacerdotes, e os anciãos, e todo o concílio, buscaram algum falso testemunho contra Jesus, para que o pudessem matar; e não o achavam.
60. E ainda que muitas falsas testemunhas se apresentavam, não o acharam.
61. Mas por fim vieram duas falsas testemunhas, que disseram: Este disse: Eu posso derribar o templo de Deus, e reedificá-lo em três dias.
62. E levantando-se o sumo pontífice, disse-lhe: Não respondes nada? O que testificam estes contra ti?
63. Porém Jesus se calava. E respondendo o sumo pontífice, disse-lhe: Conjuro-te, pelo Deus vivente, que nos digas se tu és o Cristo, o filho de Deus!
64. Jesus lhe disse: Tu o disseste. E ainda vos digo que, desde agora, haveis de ver o Filho do homem assentado à direita da potência de Deus, e vindo nas nuvens do céu.
65. Então o sumo pontífice rasgou suas vestes, dizendo: Blasfemou! Que mais necessidade temos de testemunhas? Eis que agora ouvistes sua blasfêmia!
66. Que vos parece? E respondendo eles, disseram: Culpado é de morte.
67. Então lhe cuspiram no rosto, e lhe deram bofetadas.
68. E outros o feriam com murros, dizendo: Profetiza-nos, ó Cristo! Quem é o que te feriu?
69. E Pedro estava assentado do lado de fora, na sala. E chegou-se a ele uma criada, dizendo: Também tu estavas com Jesus, o galileu.
70. Mas ele o negou diante de todos, dizendo: Não sei o que dizes.
71. E saindo à porta, viu-o outra criada. E disse aos que ali estavam: Também este estava com Jesus, o nazareno.
72. E negou-o outra vez, com juramento, dizendo: Não conheço a esse homem.
73. E dali a um pouco, chegaram os que estavam presentes, e disseram a Pedro: Verdadeiramente também tu és um deles; porque tua fala te manifesta.
74. Então começou ele a amaldiçoar, e a jurar, dizendo: Não conheço a esse homem!
75. E logo o galo cantou; e lembrou-se Pedro das palavras de Jesus, que lhe dissera: Antes que o galo cante, tu me negarás três vezes. E saindo-se para fora, chorou amargamente.

Capítulo 27

1. E vinda a manhã, entraram em conselho todos os príncipes dos sacerdotes e anciãos do povo, contra Jesus, para o matarem.
2. E levaram-no amarrado, e entregaram-no a Pôncio Pilatos, o presidente.
3. Então Judas, o mesmo que o havia entregue, vendo que já estava condenado, tornou, arrependido, as trinta moedas de prata aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos;
4. Dizendo: Pequei, entregando o sangue inocente. Porém eles disseram: Que nos importa? Tu que o vejas!
5. E lançando as moedas de prata no templo, partiu-se; e foi, e enforcou-se.
6. E os príncipes dos sacerdotes, tomando as moedas de prata, disseram: Não é lícito lançá-las na arca da esmola, porque preço de sangue é.
7. Mas tendo juntos deliberado, compraram com elas o campo do oleiro, para sepultura dos estrangeiros.
8. Pelo que foi aquele campo chamado “campo de sangue”, até o dia de hoje.
9. Então se cumpriu o que foi dito pelo profeta Jeremias, que disse: E tomaram as trinta moedas de prata, preço do precificado, que foi precificado pelos filhos de Israel.
10. E deram-nas para comprar o campo do oleiro, como me ordenou o Senhor.
11. E esteve Jesus diante do presidente. E o presidente lhe perguntou, dizendo: És tu o rei dos judeus? E Jesus lhe disse: Tu mesmo o dizes.
12. E sendo acusado pelos príncipes dos sacerdotes e pelos anciãos, nada respondeu.
13. Pilatos então lhe disse: Não ouves quantas coisas testificam contra ti?
14. E não lhe respondeu palavra alguma, de maneira que o presidente se maravilhava muito.
15. E no dia da festa, costumava o presidente soltar um preso ao povo, qualquer que quisessem.
16. E tinham então um preso afamado, que se chamava Barrabás.
17. E juntos eles, disse-lhes Pilatos: Qual deles quereis que vos solte? A Barrabás, ou a Jesus, que se diz o Cristo?
18. Porque ele sabia que, por inveja, o haviam entregue.
19. E estando ele assentado no tribunal, sua mulher lhe mandou dizer: Não tenhas nada que ver com aquele justo; porque hoje padeci muitas coisas em sonhos por causa dele.
20. Mas os príncipes dos sacerdotes e os anciãos persuadiram ao povo, para que pedisse a Barrabás; e a Jesus matasse.
21. E respondendo o presidente, disse-lhes: Qual dos dois quereis que vos solte? Eles disseram: A Barrabás!
22. Pilatos lhes disse: Que, pois, farei de Jesus, que se diz o Cristo? Disseram-lhe todos: Seja crucificado!
23. E o presidente lhes disse: Pois que mal tem feito ele? Porém eles bradavam ainda mais, dizendo: Seja crucificado!
24. E vendo Pilatos que nada aproveitava; antes se fazia mais alvoroço, tomando água, lavou as mãos diante do povo, dizendo: Inocente estou do sangue deste justo. Vede-o vós outros.
25. E respondendo todo o povo, disse: Seja seu sangue sobre nós, e sobre os nossos filhos!
26. Então soltou-lhes a Barrabás; e havendo açoitado a Jesus, entregou-o para ser crucificado.
27. Então os soldados do presidente, levando a Jesus até a audiência, ajuntaram a ele toda a tropa.
28. E despindo-o, vestiram-no com uma capa de grã.
29. E puseram sobre sua cabeça uma coroa tecida de espinhos, e uma cana na mão direita. E pondo-se de joelhos diante dele, zombavam dele, dizendo: Salve, rei dos judeus!
30. E cuspindo nele, tomaram a cana; e davam-lhe com ela na cabeça.
31. E depois de o terem escarnecido, despiram-lhe a capa, e vestiram-no com suas vestes; e levaram-no para o crucificar.
32. E saindo, acharam a um cireneu, que se chamava Simão; a este obrigaram que levasse sua cruz.
33. E assim que chegaram ao lugar chamado Gólgota – que se chama “o lugar da caveira” –,
34. Deram-lhe a beber vinagre misturado com fel; e provando-o, não o quis beber.
35. E tão logo o crucificaram, repartiram suas vestes, lançando sortes. Para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta: Repartiram entre si minhas vestes, e sobre minha túnica lançaram sortes.
36. E guardavam-no, assentados ali.
37. E puseram sobre sua cabeça a sua causa escrita: “Este é Jesus, o rei dos judeus”.
38. Então crucificaram com ele dois ladrões: um à direita, e outro à esquerda.
39. E os que passavam lhe diziam injúrias, meneando as cabeças.
40. E dizendo: Tu, que derribas o templo, e em três dias o reedificas, salva-te a ti mesmo! Se és filho de Deus, então desce da cruz!
41. Desta maneira, também os príncipes dos sacerdotes, escarnecendo juntamente com os escribas, e fariseus, e anciãos, diziam:
42. A outros salvou, a si mesmo não se pode salvar! Se é mesmo o rei de Israel, desça agora da cruz, e creremos nele!
43. Confiou em Deus, livre-o agora, se bem lhe quer! Porque ele disse: Eu sou filho de Deus!
44. O mesmo lhe lançavam em rosto também os ladrões que com ele estavam crucificados.
45. E desde a hora das seis, houve trevas sobre toda a terra, até a hora das nove.
46. E perto da hora das nove, bradou Jesus com grande voz, dizendo: “Eli, Eli, lamá sabactâni”, isto é, “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste”?
47. E alguns dos que ali estavam, ouvindo-o, diziam: A Elias chama este.
48. E logo correndo um deles, tomou uma esponja, e encheu-a de vinagre; e pondo-a em uma cana, dava-lhe para que bebesse.
49. E os outros diziam: Deixa! Vejamos se virá Elias a livrá-lo.
50. Mas Jesus, havendo bradado outra vez com grande voz, deu o espírito.
51. E eis que o véu do templo se rasgou, de alto a baixo, em dois; e a terra se moveu, e as pedras se fenderam.
52. E os sepulcros se abriram; e muitos corpos de santos que já dormiam, se levantaram.
53. E tendo saído dos sepulcros depois de sua ressurreição, vieram à santa cidade e apareceram a muitos.
54. E o centurião, e os que com ele estavam guardando a Jesus, vendo o tremor da terra, e as coisas que haviam sucedido, temeram em grande maneira, dizendo: Verdadeiramente filho de Deus era este!
55. E estavam ali muitas mulheres, olhando de longe, as quais desde Galileia haviam seguido a Jesus, servindo-o.
56. Entre as quais estava Maria Madalena, e Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu.
57. E vindo o entardecer, veio um homem rico de Arimateia, chamado José; o qual também havia sido discípulo de Jesus.
58. Este chegou a Pilatos, e pediu o corpo de Jesus; então Pilatos mandou que o corpo se lhe desse.
59. E tomando José o corpo, envolveu-o em um lençol limpo.
60. E pô-lo em um seu sepulcro novo, que tinha lavrado em uma penha. E revolvendo uma grande pedra à porta do sepulcro, foi-se.
61. E estavam ali Maria Madalena e a outra Maria, assentadas diante do sepulcro.
62. E no seguinte dia, que é o segundo dia da preparação da Páscoa, vieram os príncipes dos sacerdotes, e os fariseus juntamente, a Pilatos;
63. Dizendo: Senhor, lembramo-nos de que aquele enganador disse, vivendo ainda: “Depois de três dias, ressuscitarei”.
64. Manda, pois, reforçar o sepulcro, até o dia terceiro. Para que não venham seus discípulos de noite e o furtem, e digam ao povo que ressuscitou dentre os mortos; e será o último erro pior que o primeiro.
65. E disse-lhes Pilatos: A guarda tendes; ide, reforçai-o como bem entenderdes.
66. E indo eles, reforçaram o sepulcro com guardas, selando a pedra.

Capítulo 28

1. E à véspera do sábado que amanhece para o primeiro dia da semana, veio Maria Madalena, e a outra Maria também, para ver o sepulcro.
2. E eis que se fez um grande tremor de terra. Porque o anjo do Senhor, descendo do céu, e chegando, tinha revolvido a pedra da porta do sepulcro; e estava assentado sobre ela.
3. E sua vista era como a de um relâmpago; e sua veste, branca como a neve.
4. E de medo dele, ficaram os guardas assombrados; e tornaram-se como mortos.
5. E respondendo o anjo, disse às mulheres: Não temais vós outras, porque eu sei que buscais a Jesus, o que foi crucificado.
6. Não está aqui, porque já ressuscitou, como ele disse. Vinde, vede o lugar onde foi posto o Senhor!
7. E ide logo, dizei a seus discípulos que já ressuscitou dos mortos. E eis que ele vos vai adiante a Galileia; ali o vereis. Eis que vo-lo tenho dito.
8. Então elas, saindo depressa do sepulcro, com temor e grande alegria, foram correndo a dar as novas aos seus discípulos.
9. E indo elas a dar as novas aos seus discípulos, eis que Jesus lhes saiu ao encontro, dizendo: Salve! E chegando elas, e agarradas a seus pés, o adoraram.
10. Então Jesus lhes disse: Não temais! Ide, dai as novas a meus irmãos, para que vão à Galileia; e lá me verão.
11. E havendo elas ido, eis que alguns dos da guarda vieram à cidade, e deram aviso aos príncipes dos sacerdotes acerca de todas as coisas que tinham acontecido.
12. E reunidos eles com os anciãos, e tendo juntos deliberado, deram muito dinheiro aos soldados,
13. Dizendo: Dizei isto: Seus discípulos vieram de noite, e o furtaram, estando nós outros dormindo.
14. E se isto chegar aos ouvidos do presidente, nós o persuadiremos, e vos faremos seguros.
15. E eles, tomando o dinheiro, fizeram tal como estavam instruídos. E foi este dito divulgado entre os judeus, até o dia de hoje.
16. Porém os onze discípulos se foram à Galileia, ao monte onde Jesus lhes tinha ordenado.
17. E quando o viram, adoraram-no; mas alguns duvidavam.
18. E chegando Jesus, falou-lhes, dizendo: Toda autoridade me é dada no céu e na terra.
19. Portanto ide, ensinai a todas as gentes, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-lhes que guardem todas as coisas que eu vos tenho mandado.
20. E eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo. Amém.